Velhice

Velhice

Onde caberá o velho no mundo de hoje? Ser velho é ficar com dois ou três hábitos, depuração de uma vida inteira, e não vejo muito como uma pessoa que se fez e foi feita de um jeito, vá de súbito ser uma pessoa jovem. Mesmo porque, em plena vitalidade, não se pode advinhar que espécie de velho se vai ser. O homem ainda moço de hoje, como saberá ele, desde já, se não vai se transformar num velho que só se dignifica se tiver bengala e uma companhia para chamar? Velhice é a última chance das reivindicações, e estas, quase sempre mantidas secretas, desabrocham como surpresa. Ninguém sabe, pois, de que tipo será. Na velhice o amor é seco como a febre de quem não transpira, amor sem ópio nem morfina. E “eu te amo” é uma farpa que não se pode tirar com uma pinça. Farpa incustrada na parte mais grossa da sola do pé. O que resta? Viver automaticamente até que a morte natural chegue.

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