Ação questiona decreto do governo que garante exclusividade para o Banco do Brasil e atinge direito de escolha de 200 mil servidores públicos
O Tribunal de Justiça da Bahia dará prosseguimento nesta quarta-feira, dia 6, ao julgamento do mandado de segurança que questiona o monopólio do Banco do Brasil no mercado de crédito consignado para o servidor público. A análise do processo foi iniciada na quarta-feira passada, mas interrompida pelo pedido de vistas da desembargadora Maria da Purificação Silva. Até a suspensão, apenas o relator do caso, Carlos Alberto Dultra Cintra, havia votado, negando o pedido de quebra da exclusividade.
No Estado, decreto do governador Jaques Wagner, editado em janeiro do ano passado, concedeu ao banco federal o privilégio de operar sozinho no mercado de aproximadamente 200 mil funcionários públicos. A Associação Brasileira dos Bancos (ABBC), que representa cerca de 90 instituições financeiras de menor porte, e a Federação Interestadual dos Servidores Públicos Municipais e Estaduais (Fesempre) impetraram um mandado cada contra a prática. A queixa de autoria da ABBC é a que está sob apreciação do pleno do TJ-BA.
Será a primeira vez que o Judiciário baiano irá se pronunciar sobre o decreto. Apesar do curto período em que o mandado da ABBC esteve em debate, semana passada, foi possível verificar a existência de pontos de vista divergentes entre os 31 desembargadores da Corte. O voto do relator, pela permanência da exclusividade, foi confrontado de pronto por colegas. O desembargador Gesivaldo Nascimento Britto, que ainda não votou, afirmou ter recebido com “espanto” o pronunciamento de Dultra Cintra e ressaltou que deve ser preservada a autonomia do servidor, na condição de consumidor, para escolher o que julgar ser melhor para ele. Maria da Purificação é a relatora da ação movida pela Fesempre e, antes de se posicionar, optou por analisar o outro processo.
Batalha
O debate sobre a exclusividade no empréstimo com desconto em folha para servidores está em pauta em diversas localidades do país. A origem do problema é a mesma: um banco adquire o direito de explorar a folha de pagamentos do funcionalismo por meio de contratos milionários, e o ente público beneficiado garante ao parceiro a reserva no mercado de crédito. Até agora, apenas dois tribunais analisaram no mérito os questionamentos, e ambos derrubaram o monopólio: Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Norte.
Os argumentos jurídicos que atestam a ilegalidade são diversos. A restrição à competitividade é considerada inconstitucional, pois fere o princípio da livre iniciativa garantido no artigo 170 da Constituição Federal. O artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor estabelece o direito de livre escolha, que o trabalhador do setor público baiano está impedido de exercer. A lei 8.137, de 1990, é mais incisiva e considera crime contra a ordem econômica a eliminação da concorrência em um determinado segmento.
Contudo, os advogados que assinam o mandado de segurança em julgamento têm um trunfo em destaque: a circular 3.522 do Banco Central, editada em 14 de janeiro. O Bacen é a autarquia responsável por regular e fiscalizar o sistema financeiro nacional. O parecer reconhece a ilegalidade da prática e proíbe a criação de convênios desse tipo na área do crédito consignado.
Como se não bastassem os termos jurídicos, na Bahia, o decreto é nocivo ao trabalhador também do ponto de vista financeiro. A taxa de juros média praticada pelas financeiras, em qualquer capital do país, é próxima de 2% ao mês. O Banco do Brasil oferece o empréstimo com taxa de 3,14%. Além disso, estabelece restrições aos correntistas. O servidor está proibido de portar financiamentos de outras instituições para o BB e, se o nome dele fizer parte de qualquer cadastro de proteção ao crédito por qualquer motivo, fica impedido de ser atendido.
Investigação
O primeiro convênio do governo baiano com o Banco do Brasil foi estabelecido em 2007, em uma transação estimada em R$ 400 milhões depois que o Executivo ter rompido o convênio que detinha com o Bradesco. Um aditivo foi assinado, no ano passado, em que o banco empenhou mais R$ 201 milhões. Essa renovação trouxe a cláusula de exclusividade. O contrato tem validade até 2015 e foi alvo de investigação pelo Ministério Público Estadual.
Além dos servidores públicos, outras categorias também são contra a exclusividade. Os funcionários de empresas de crédito e agentes autônomos, por exemplo, são atingidos de forma direta e passaram a conviver com o desemprego. Edmilson Andrade é o presidente da Associação Baiana dos Agentes de Crédito e estima em 40 mil o número de trabalhadores impedidos de operar no Estado desde que o decreto governamental entrou em vigor.
Ele e um grupo de profissionais prometem comparecer novamente à sede do Tribunal de Justiça nesta quarta-feira para sensibilizar os desembargadores sobre a necessidade da liberalização do mercado. “Nossa pretensão é que seja garantido nosso direito ao trabalho. Provavelmente, não foi feito um estudo pelo governo do impacto social que foi causado por esse decreto em cima de quem atua de forma autônoma. A gente confia nesse julgamento, no bom senso e na aplicação da lei”, relata Andrade.
Fonte:FSB COMUNICAÇÕES