“Posso não concordar com nenhuma das palavras que você disser, mas defenderei até a morte o direito de você dizê-las.” (Voltaire,1694-1778)
É senso comum neste Brasil continental da existência de leis para tudo, requerendo-se muito mais energia para o cumprimento de suas disposições existentes do que novas iniciativas parlamentares em busca de outras ações normativas/reguladoras para um desejável convívio social.
Há, inclusive, quem afirme a existência no País de legislação avançada, a exemplo do Estatuto da Criança e do Adolescente, que imprime modernidade normativa a um dos problemas mais evidentes dos tempos atuais, no caso daqueles – crianças e adolescentes – ainda carentes de apoio da sociedade e do próprio estado nacional, sabidamente brasileiros à margem da educação, da saúde, do lazer ou de um convívio social digno, com um mínimo de cidadania.
Aqueles que militam na educação, em quaisquer dos seus níveis, conhecem muito de perto suas próprias limitações: deficiência formativa, carência de meios pedagógicos, falta de estímulos à docência, estruturas não-condizentes, medidas superficiais de atendimento às necessidades existentes, precária participação da família – principalmente no ensino infantil e fundamental, mas, extensivos aos demais níveis – e questões outras, como a sobrevivência profissional dos envolvidos na arte do ensino e da aprendizagem.
Muitos simplificam a educação, aparentemente com manobra de pura transferência de responsabilidade, num verdadeiro by-pass, ao afirmarem ser ela “uma obrigação do estado”, como se o individuo responsavelmente cidadão ou a família – célula mater do tecido nacional – simplesmente cessasse sua competência, transferindo responsabilidades que, solidariamente, cabem-lhes, igualmente, na forma da lei por sua condição de litisconsorte no processo transformador esperado, seja de forma direta ou indireta, da ação social consequente ao ensino e à aprendizagem, na formação cidadã para a própria satisfação, o viver em harmonia social, para o trabalho e para a vida.
Talvez, dentre as varias causas desse “entendimento simplificado”, esteja o pouco conhecimento divulgado do que seja a obrigação do poder público (Federal, Estadual e Municipal) em face a educação infantil, a básica, a média e a própria educação superior, quando seus disciplinamentos estão contidos na Constituição Federal (CF), Constituições Estaduais (CE) e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), além de legislação complementar que subsidia o planejamento, a organização, normatização, oferta e execução das políticas educacionais demandadas pela sociedade brasileira.
A Constituição Federal vigente desde 1988, no seu Art.205, dispõe: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (grifo nosso), observando-se, de imediato, três variáveis significativas ao se conceituar a “educação, direito de todos…”, no caso, o Estado, a família e a sociedade. Pode-se afirmar que a educação se trata de algo abrangente, fundamentado na CF e que assiste a “todos”, mas, como visto, ainda dependente de outros atores para sua implementação.
A própria Constituição lavrou “… dever do Estado e da família, a ser promovida e incentivada com a colaboração da sociedade…”, prevendo o legislador, por conseguinte, não apenas os encargos do Estado, mas, complementando-os com as ações da família e da sociedade, co-participes, portanto, das atividades dinâmicas desejáveis.
A LDB, Lei n°9.394/96, editada após oito anos de vigência da CF, ao cuidar sobre Princípios e Fins da Educação Nacional, no seu Art.2° afirma:” A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. (grifo nosso).
Como se sabe, a LDB estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, constituindo-se legislação normativa, à época de cunho politico-reformador, técnico e filosófico, vinculando a educação ao mundo do trabalho e à prática social, com proposições transformadoras principalmente para o ensino escolar mas, no todo, contemplando também o ensino superior.
Ao se observar a Carta Magna e a LDB, pode-se inferir que, ambas, situam o Estado e a família (aqui percebida semanticamente, por sua amplificação, como sociedade) verdadeiros e indispensáveis pilares fundamentais do processo educacional, mas, nem sempre assim visualizados por quantos imaginam a importância e indispensabilidade da Educação e, até, julgando-a “ser para todos” – o que é desejável -, esquecendo-se da co-participação prevista e necessária em todas as fases que norteiam os procedimentos educacionais: desde sua concepção, viabilidade, oferta, operacionalidade, avaliação e a necessária continuidade a ser implementada no Município, Estado e País.
Requer-se, pois, a conjugação do verbo participar pela família e sociedade – na plenitude consciente do fazer democrático – principalmente por aqueles que desejam uma escola pública ou privada com qualidade, sepultando o by-pass ou, o que é melhor, substituindo-o pela ação motivadora que interage e constrói.
Faz-se necessário acompanhar o projeto pedagógico, a administração escolar e os seus desafios e, de forma a se contribuir, mesmo minimamente, no que estiver ao seu alcance, a fim de que a educação seja efetivamente por e para todos, até porque assim fazendo estarão apenas exercendo o “dever legal”, previsto no espírito da lei, de acompanhar e ser parte do desenvolvimento dos seus filhos/dependentes, na idealização racional de um amanhã com perspectiva de superação de obstáculos, formação cidadã e qualidade de vida.