A delegacia estava silenciosa e muito iluminada. Na sala de espera, uma mulher sentada sozinha chorando baixinho, dizendo para si mesmo: “Eu só quero vê-lo. Só quero saber se ele está bem.”.
Violência doméstica – disse a mulher da recepção, apontando a mulher chorosa. Ele bate nela, ela liga pra gente e depois decide que não quer prestar queixa.
Neste homem taciturno, há uma paixão exclusiva e ardente. Mas sempre uma conversa mansa, de quem manda na relação, muito ciúmes. Eis que a situação fica muito grave, pois solta os cabrestos da fantasia de seu lado sombra.
A mulher na delegacia ficou um bom tempo ali imóvel, em atitude apática, com as mãos enlaçados atrás da nuca onde recebeu o soco. Por fim, lhe vieram pensamentos. Ou melhor, imagens.
O tempo, de repente, retrocedeu a grande velocidade. O tempo era um filme que mostrava a sua vida de trás para a frente. Nos olhos dessa mulher se acende de vez em quando uma faísca de felicidade. E, se não é felicidade, é de alegria. Havia amado o rosto dele da mesma maneira que amava o brilho da lua e a água fria e azul do mar.
Sua vida sempre havia sido restrita assim, com os limites tão estreitos que, às vezes, pareciam não sonhar com outro futuro. Será que ela nada mais era do que sua posição sem expressão no lar?
Pode a qualquer momento o vento da incompreensão soprar e atingir a brasa da violência
acendendo e reativando uma nova agressão. Todos temos queimaduras internas, e a mulher que sofre violência doméstica, estas queimaduras não saram, poder se trasformar em submissão ou revolta e luta, para sair desta vida.
Ela pode perdoar, uma, duas três vezes, mas, dentro dele vive a mesma semente da violência, das agressões anteriores, à espera do momento oportuno de explodir, a mulher precisa sair do conformismo, com seu dedo do meio apontando para a denúncia do companheiro.