Luxúria, luxuriosa, luxuriante… Gosto de ouvir essas palavras aplicadas à vegetação. É inútil pretender o dicionário nos informar que nesse caso elas apenas querem dizer viço.
Não é apenas viço, é o vício do viço, é a exuberância do viço, é o sensualismo da mata dissoluta, em que as formas de vida se misturam, se matam, se amam.
Tudo, na floresta, é libertinagem e luta, os sexos das flores se afirmando em guerra sobre os verdes múltiplos. A ligeira visão da mata me devolve hoje a impressão de um dia remoto em que me arrisquei sozinho, na Chapada Diamantina, sem guia.
Aquele sentimento de estar no seio de um organismo grande, imenso, feito de muitos outros, como um grande monstro de vida – e eu perdido no seu ventre, nos seus cabelos e viscosidades, na sua sombra, nos seus humores. A luta tramada, o corpo a corpo de troncos, cipós, ramos, raízes. E a vida animal que fervilha de insetos e répteis, aves , bichos pequenos e grandes, gritos, uivos, zumbidos, tudo repele o homem e ao mesmo tempo o aceita no seio do seu sofrimento.
Os que morreram de febre no meio da mata, esses devem ter vivido sua morte com uma estranha vida múltipla, devem ter morrido mais e ao mesmo tempo menos, tão estranho e total deve ser o sentimento de que seu ser será absorvido logo em carnes, folhas , asas, troncos, lodos, tudo úmido de vida, e na froresta da fronteira com o Peru, no Oeste do Amazonas, o Vale do Javari, tão importante para o Brasil, que teve o processo de demarcação finalizado no governo de FHC, e tem uma área equivalente a quase dois estados do Rio de Janeiro.
É considerada a segunda maior demarcação depois da terra Ianomâmi homologada em 1992 no governo Fernando Color. O jornalista inglês desaparecido Don Philips, fazia a viagem para seu livro “Como salvar a Amazônia”. A maioria dos textos tem como pauta o avanço do gado, do garimpo e da soja em regiões de florestas conservadas, então para mim a situação fica muito grave, pois solta os cabrestos da minha fantasia em relação ao nosso governo e tudo que o cerca.
O tempo nestes últimos três anos é um filme que mostra a ação na Amazônia de trás para a frente, com o título “Tormento”, este desaparecimento é simplesmente mais uma cena triste desta película, eles perdidos ou mortos na mata dissoluta.