Uma Travessia Servindo à Cidadania

“Sete anos de pastor Jacob servia/Labão, pai de Raquel, serrana bela;/

mas não servia ao pai, servia a ela,/e a ela só por premio pretendia”, Camões

(1524-1580).

É razoável afirmar-se que a paixão, por mais incontida que seja, é

momentânea além de imprevista, e não se configura em plano no qual

se mantenha ao longo do tempo. Em contraponto, o desejo vai muito

além, superando as marchas do advir como um companheiro constante

nas caminhadas dos dias, por vezes ao longo de toda a existência e, ao

fim, concretizando-se em realidades à semelhança de sonhos que se

materializam.

Não à toa, é plausível perceber: o homem, de certa forma, está representado

pela grandeza ou medida dos seus desejos! Na verve do magistral

Camões, o pastor serviu “sete anos”, dobrou-se às agruras do tempo e

ao jugo do servir porque havia um desejo, uma pretensão, um objetivo,

Raquel: “… servia a ela, e a ela só por premio pretendia”. E, conforme

consta no poema, ainda sendo enganado por Labão, ele afirma “Mais

servira, se não fora/Para tão longo amor tão curta a vida!”.

Os que serviram, ou ainda servem à causa da Educação, na perspectiva

existencial de um desejo que não se ultima, compreendem o significado

da travessia representado pela vida dedicada ao magistério, que sempre

aponta a possibilidade de um início em função da aprendizagem.

Entretanto, não indica o seu final porque compreendem que a Educação

perpassa à própria existência a exigir, sempre, o recomeçar, a continuidade

na senda da travessia, superando-se óbices como aqueles poeticamente

antevistos e lembrados nos versos camonianos, “Mais servira, se não

fora/Para tão longo amor tão curta a vida!”

As vicissitudes e os dissabores são muito mais partes componentes da

travessia, obstáculos que exigem esforços para novas realizações. São

instigantes desafios a serem superados por aqueles que adicionam à

própria crença os mecanismos de ação, a seu tempo e distintas formas,

como estratégias adequadas ao alcance das finalidades sagradas que a

Educação representa.

Em apoio à saga dos educadores, pelos caminhos do tempo, seria o caso,

aqui, lembrar o pensamento de Bertolt Brecht quando ele afirma: “Há

homens que lutam um dia e são bons, há outros que lutam um ano e são

melhores, há os que lutam muitos anos e são muito bons. Mas há os que

lutam toda a vida e estes são imprescindíveis”.

A longa travessia servindo à cidadania requer, além da dedicação

intelectual e do esforço físico, parte da alma dos seus atores, em todos os

níveis e diferentes teatros da vida social, lado a lado, como numa corrida

de fundo, bastão passado mão a mão até à chegada e, daí, simbolicamente

ao podium, o espaço de conquista antevisto, proposto e almejado.

Em decorrência, numa sociedade em transformação, há que se

referenciarem os imprescindíveis por suas posições e enfrentamentos

contínuos, a partir dos quais hão de gerar, na seara da vida, os frutos

que o tempo revela e garante, por conta dos seus esforços na travessia da

Educação desejavelmente a mais cidadã para todos.

Servir torna-se, pois/Quase como idolatria/Faz-se hoje ou depois/Na luta

de cada dia/No viés da Educação/Pé na estrada, mão a mão/A construirse

Cidadania!

Simples, não? Que a Travessia de 2016, recém-iniciada, venha a

materializar-se e produzir seus frutos!

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