Separar corretamente o lixo em casa, garantir coletiva seletiva em todas as cidades brasileiras, reciclar parte da produção das empresas e multar e até prender quem descumprir as regras. Essas são algumas das exigências de uma nova lei
A Política Nacional dos Resíduos Sólidos levou 20 anos até ser aprovada em votação no Senado, em 2010, mas avança com pressa em direção aos prazos finais que determinam, por exemplo, o fim de todos os lixões no país até agosto de 2014. Só para se ter ideia do desafio, na Bahia, são mais de 359 lixões a céu aberto e pouco menos de 60 os aterros sanitários, segundo dados de 2011 da Secretaria de Desenvolvimento Urbano (Sedur). A lei, que estabelece ainda a implantação de coleta seletiva em 100% das cidades e até aulas de educação ambiental nesse mesmo período, tem exigido mudanças da iniciativa privada, dos estados, municípios e dos consumidores.
Para especialistas de meio ambiente, a PNRS é considerada um marco, porque entrega à sociedade a responsabilidade compartilhada dos resíduos sólidos, ou seja, de tudo o que vira lixo. Se antes havia um vácuo sobre quem devia cuidar da destinação de certos lixos, com a nova lei, não sobram frestas. Da casca de banana à bateria do celular que já ficou ultrapassada e não tem mais uso, todo lixo terá alguém para chamar de seu.
Hoje, o Fórum Agenda Bahia realiza o terceiro seminário deste ano: Resíduos Sustentáveis, tema de Desenvolvimento Sustentável. Especialistas, executivos e autoridades debatem os desafios e as soluções para a Bahia com a nova lei.
Por conta das punições e multas que poderão sofrer, caso não obedeçam a lei, os municípios brasileiros têm corrido contra o tempo para ajustar seus planos de gestão de resíduos. Na primeira chamada, em agosto do ano passado, quando as prefeituras tiveram que apresentar um plano mostrando como cuidar dos seus lixos, apenas 10% dos municípios no país passaram no teste, segundo a Confederação Nacional dos Municípios (CNM). A partir daí, as administrações que não entregaram o plano ficaram impossibilitadas de pedir recursos do governo federal para cuidar do manejo do lixo.
Para a presidente da União dos Municípios da Bahia (UPB), Maria Quitéria, o principal problema é o alto custo da elaboração das metas. “A dificuldade de implementar o plano é nacional. Nossa expectativa é fazer com que os municípios se organizem em consórcios para driblar o alto custo de elaboração. Temos alertado os municípios (para o fim do prazo estipulado), mas o momento é de grande dificuldade financeira. Hoje, a Bahia conta com 16 Consórcios Públicos Municipais, sendo que 15 deles são de multifinalidades”, afirma a prefeita de Cardeal da Silva.
Os consórcios entre municípios, explica a presidente da UPB, serviriam para atenuar gastos, como o exigido para a implantação de aterros sanitários pela PNRS. Segundo Maria Quitéria, os municípios alegam falta de ajuda financeira do governo federal para acelerar a confecção dos planos. “Nossa estimativa é que os municípios com até 50 mil habitantes precisarão de R$ 6 a R$ 7 por habitante para elaborar o plano. Mas, até o momento, essa ajuda financeira não chegou. Outro entrave é a carência de técnicos especializados”, alerta.
Força-tarefa
A prefeitura de Salvador, que recebeu na gestão anterior o cartão amarelo por não entregar o plano a tempo, montou força-tarefa para cumprir o prazo. Apesar de já possuir aterro sanitário desde 1998, a prefeitura trabalha para dar conta da implantação de uma equipe responsável pela coleta seletiva, os prazos e metas necessários para manejo dos resíduos, além de estimular a educação ambiental.
Segundo Rosa Amália, assessora de Planejamento da Limpurb, 18 associações e cooperativas estão cadastradas para auxiliar no reaproveitamento de materiais recicláveis, parte do plano de coleta seletiva. “Também está previsto a implantação de 200 postos de entrega voluntária até 2016”, explica. Os PEVs serão distribuídos por áreas de Salvador.
O coordenador de Infraestrutura Urbana e Saneamento da Secretaria Municipal da Infraestrutura e Defesa Civil (Sindec), Carlos Vicente, é otimista em relação ao prazo estipulado pela União. “Nosso objetivo é tentar concluir esse processo até o final deste ano”, afirma.
Para o setor empresarial, o prazo também exige mudanças no setor produtivo. Se, antes, cabia aos estados e aos municípios dar fim aos resíduos produzidos na cadeia de consumo, com a logística reversa, os fabricantes serão responsáveis pela destinação final daquilo que produzem. Só da construção civil são coletadas 99 mil toneladas de resíduos sólidos diariamente, segundo dados do IBGE em 2011. Apenas os municípios da região Nordeste coletam mais de 17 mil toneladas por dia.
O presidente da Associação dos Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário (Ademi), Nilson Sarti, afirma que os municípios baianos não estão preparados para cuidar da destinação final dos resíduos sólidos. “Hoje as construções já estão preparadas para produzir menos resíduos sólidos. Temos tecnologias. Boa parte do que é produzido já é reciclado na própria obra. Exceto Salvador, que já possui aterro e sistema de aproveitamento desses resíduos, a maioria dos municípios do interior não têm. Eles não estão preparados para cumprir esses prazos”, afirma.
Para os produtores de pneus, baterias, embalagens de agrotóxicos, óleos lubrificantes, embalagens de óleos lubrificantes, produtos eletroeletrônicos, pilhas e alguns tipos de lâmpadas, a PNRS estabelece regras mais rígidas. Essa parte do setor privado terá de dar conta da destinação final dos produtos consumidos independente da oferta de serviços públicos. Para isso, acordos estão sendo elaborados para que todos cumpram as metas.
“Os acordos setoriais são contratos firmados entre o poder público e os fabricantes, importadores, distribuidores ou comerciantes, visando a implantação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida do produto”, explica Arlinda Coelho, gerente corporativa de Desenvolvimento Sustentável da Fieb.
O primeiro acordo desse tipo foi assinado pelo governo federal em dezembro de 2012 e promete recolher 60% das embalagens de óleos lubrificantes em postos de gasolina do litoral, de norte a sul do país. A segunda etapa, que recolherá as embalagens do restante 40%, aí incluídos os estados da região Norte, deverá ficar pronta até 2016. Na esfera estadual, além da logística reversa das embalagens de óleo, um acordo setorial para destinação de lâmpadas já está em andamento.
Até maio deste ano, outro acordo de logística reversa destinou 1.333 toneladas de embalagens vazias de defensivos agrícolas na Bahia. O número é 6% maior comparado ao ano passado, segundo dados do Sistema Campo Limpo, que reúne agricultores e fabricantes.
Fonte: Wladmir Pinheiro/Correio