Nasci no Hospital Espanhol no dia oito de fevereiro de 1957, às 23 horas e 50 minutos, quase no dia nove, de um parto natural, meus pais moravam em Brotas, sendo a população de Salvador seiscentos mil habitantes.
A verdade era que todo mundo me via de uma certa maneira por dentro, e hoje o número de pessoas novas que são capazes de me ver como aquela pessoa “lá dentro” e não apenas uma coleção de fragilidades impostas pela idade, é limitado, apenas minha mãe hoje com oitenta e cinco anos e algumas tias.
Não tenho mais tantas pessoas por perto que me conhecem a vida toda. Da época que morei em Brotas até os cinco anos e em Porto Seguro dos cinco aos nove anos, quase todos já morreram, e para minha mãe as referências são menores ainda, com a morte de meu pai.
O tempo passou e o silêncio recaiu sobre mim, como a escuridão da noite, hoje o por do sol esta baixo no horizonte. O que resta do dia é iluminado e calmo. Fiquei um bom tempo imóvel, em atitude apática, com as mãos enlaçados atrás da nuca, olhando o por do sol.
Por fim vieram pensamentos. Ou melhor, imagens. O tempo, de repente, retrocedeu a grande velocidade. O tempo é um filme que mostra a minha vida de trás para a frente. Nos meus olhos se acende de vez em quando uma faísca de felicidade. E, se não é felicidade, é de alegria. A chuva do tempo caío nos túmulos, do meu nascimento até hoje. Lápides molhadas e um cheiro fresco de silêncio. O efêmero é a própria essência do viver é o que a torna bela.
João Misael Tavares Lantyer