“Aquele que é a Palavra estava no mundo, e o mundo foi feito por intermédio dele, mas o mundo não o reconheceu. Veio para o que era seu, mas os seus não o receberam. Contudo, aos que o receberam, aos que creram em seu nome, deu-lhes o direito de se tornarem filhos de Deus, os quais não nasceram por descendência natural, nem pela vontade da carne nem pela vontade de algum homem, mas nasceram de Deus.” (João 1.10-13)
A salvação é um conceito importante para nossa fé. Queremos a certeza da salvação e normalmente isso refere-se à nossa preocupação com o que acontecerá conosco quando morrermos. Há alguns cristão que, à vista disso, vivem em função da morte. No Antigo Testamento a palavra hebraica para salvação é yesua e o sentido é “segurança”, “superação de dificuldades” e “ser tirado de um lugar apertado para um lugar amplo”. Praticamente não aparece nos textos uma preocupação com a salvação pós morte. O termo é sempre ligado à existência aqui. No Novo Testamento o vocábulo grego para salvação é sotéria e o sentido é amplo: “cura”, “recuperação”, “remédio”, “redenção”, “bem-estar”, “libertação”, “absolvição”. E nele sim, além do termo relacionar-se ao corpo e à vida aqui, relaciona-se também como espírito e a vida após a morte.
No Evangelho de João temos um conceito singular, não para o vocábulo exatamente, mas para a ideia de salvação. Nele a salvação tem a ver com tornar-se participante da natureza divina. E é isso que encontramos na abertura do Evangelho. No sermão do monte Jesus transmite a mesma ideia, quando Ele diz, por exemplo: “Amem os seus inimigos e orem por aqueles que os perseguem, para que vocês venham a ser filhos de Seu Pai que está nos céus” (Mt 5.44-45). E no verso 48, Ele diz: “Portanto, sejam perfeitos como perfeito é o Pai celestial de vocês”. Ser salvo a luz disso, é ser alguém em conformação com Deus. João diz que, quando cremos, recebemos o direito, algumas traduções dizem, o poder, de nos tornamos filhos de Deus. O termo que João usa é “exsouzia”, que significa poder, direito, capacidade, enfim, tudo que é necessário para tornar viável e possível. Portanto, a salvação é uma condição existencial, na qual, pela graça recebemos a condição e os recursos para vivemos convertendo-nos a Deus, tonando-nos semelhantes a Cristo. Ser salvo é estar sendo transformado em vida. Salvação tem a ver com ser e tornar-se. É dádiva e é compromisso! É para a vida aqui e para a vida depois daqui.
É exatamente por que isso que, salvos por Cristo seguimos, nos tornando sinais do Reino vindouro, do Reino de Deus. A identidade do salvo está muito para além da conformidade religiosa, muito para além de um enquadramento em certo gabarito ético religioso. Tem a ver com estar unido de modo irrevogável a Deus, para aprender a ser filho de Deus e agir como Deus. Algo que se realiza em cada um e a partir da vida de cada um, de onde cada um está e de quem cada um é. Ser salvo é ser objeto da boa obra de Deus, na linguagem de Paulo aos Filipenses (Fl 1.6). A salvação é algo dinâmico. Ela produz repercussões no ambiente onde o salvo está. O salvo revela e manifesta os sinais de sua filiação com Deus. Do fato de que Deus está agindo nele e ele está aprendendo com Deus a ser gente. Gente conforme o coração de Deus. E quem julga a autenticidade de tudo isso é o Espírito de Deus. E é Ele quem testifica em nosso próprio espírito: “sim, você é filho de Deus” (Rm 8.16). É assim que o Evangelho e o testemunho dos salvos nas Escrituras nos levam a entender salvação. E então? É assim que você a compreende?