“Ele bloqueou o meu caminho, e não consigo passar; cobriu de trevas as minhas veredas. Despiu-me da minha honra e tirou a coroa de minha cabeça.” (Jó 19.8-9)
É sobre Deus que Jó está falando. E ele está correto. Foi realmente Deus quem decidiu e permitiu toda sua dor. Ele não consegue entender a razão disso. E quem entenderia? Seus amigos defenderam seus pontos de vista e com isso apenas afastaram-se da verdade. E insistiram ao ponto de se tornarem cruéis. A Bíblia é repleta de ensinos para nossa edificação espiritual, mas podemos tomar caminhos como os escolhidos pelos amigos de Jó e nos afastar da verdade. Pensando que estamos sendo fiéis, podemos nos revelar cruéis e nem notar a incompatibilidade. Podemos nos perder do coração de Deus e, fatalmente, do coração das pessoas, como se não importasse.
Este livro inquietante tem um tema e um objetivo. Seu tema é a devoção humana a Deus. Para satanás ela é puro interesse pois o ser humano é incapaz de amar um ser tão poderoso, bom e sábio, mas cujas escolhas, decisões, são incompreensíveis. Mas Deus, nosso Criador, pensa diferente. Ele acredita na devoção amorosa do homem, pois o criou capaz para isso, ainda que incapaz para compreendê-lo. E é em Jó que tudo está sendo verificado. Ele vive o devoto que cada um de nós deveria ser. O assunto do livro não é Deus e Seus critérios, mas nós e nossa espiritualidade, devoção e religiosidade. Jó é o bom exemplo e seus amigos, os maus. Mas seus diálogos nos deixam confusos sobre isso. Afinal, o que Jó diz parece errado e o que eles dizem parece certo. Deus porém está vendo além. Quem somos nós nessa trama? Talvez os dois. Seres oscilando entre amor e interesses, espiritualidade compassiva e crueldade religiosa.
Este livro chega a ser humilhante. Jó é bom demais! É humano demais! O Deus que o ameaça e fere, o cerca e deixa sem saída, recebe suas reclamações, mas não deixa de receber seu respeito e devoção. Chegamos ao ponto em que não há mais saída para Jó. Apenas a morte e isso, quando Deus quiser. É como ele se sente, mas não desiste de Deus. Que conquista foi essa que Deus fez em Jó que o atou a Ele de forma tão definitiva? Como Jó se entregou assim, tão irrevogavelmente? Que pertencimento é esse, assim tão inquebrável? Dá-nos, ó Deus, a benção de sermos Teus dessa forma. E que isso seja possível sem precisarmos ver tanta escuridão, pois é difícil acreditar que poderíamos nos sair tão bem quanto Jó.