Recebi, com muito orgulho e júbilo, o convite para escrever um breve artigo sobre a obra do TAURINO ARAÚJO, que tem por título “A Hermenêutica da Desigualdade”. Não haveria momento mais propício para fazê-lo do que este em que vivemos os efeitos da pandemia da COVID-19, pois foi exatamente aí que saímos da teoria para a “praxis”…
A obra, por sem dúvida, é de vanguarda e como tal desperta a atenção e o interesse de quantos mourejam no campo do Direito, como nos demais ramos do conhecimento ligados aos aspectos sócio-filosóficos. Exatamente por isso, pode ser que encontre a resistência daqueles que se acham aferrolhados, dentro de uma visão restrita e cartesiana. Mas nisso reside a grandeza de sua mensagem, porque inovar é para poucos e são estes que constroem o futuro. Afinal, estamos ou não a todo momento sendo desafiados pela Esfinge a decifrar-lhe os enigmas interpostos no caminho?
A obra de Taurino se propõe – e consegue – desvendar esses enigmas, fazendo-o com maestria inigualável. Para tanto, buscou superar, como bem diz o autor, “o inconveniente de se tratar de um saber anistórico, pois enquanto a desigualdade formal independe dos condicionamentos sociais concretos, esta hermenêutica da desigualdade reporta-se à situação determinada, de cunho global, ocorrente nos diversos sistemas de justiça, não apenas no sentido de identificá-la, mas de diminuí-la”, não através da law in the books”, mas da “law in action”.
A construção da tese esposada pelo autor não é fruto da observação solitária de um cientista social encastelado em torre de marfim, examinando a realidade por meio de pipetas ou de tubo de ensaio, mas da vivência compartilhada, resultado da experiência de uma “praxis” crítica que consiga enxergar não apenas o que se passa no palco dos acontecimentos, como, igualmente e sobretudo, na coxia do teatro da vida.
De nada adianta ao homem conquistar o espaço, construir telescópios monumentais para observar o universo, aperfeiçoar chips e computadores, dominar a robótica, se não conseguir fazer com que as desigualdades sociais sejam diminuídas e um dia, quem sabe, inteiramente anuladas e extirpadas.
Jamais se perca de vista que fomos feitos semelhantes uns aos outros, mas por um grande equívoco histórico, como se fora um desvio de curso, fizemo-nos dessemelhantes, evidenciando o lado mais cruel da natureza humana. Espero que, navegantes que somos nessa imensidão que é o mar da vida, assim como os antigos argonautas se orientavam pelas estrelas, também nós possamos nos guiar por essa obra luminar, a fim de alcançarmos um lugar em que a igualdade seja a regra e a desigualdade, não uma exceção, mas apenas uma lembrança de tempos sepultos.
Por Sérgio Habib. Professor de Direito Penal. Advogado Criminal.