Puxado pela alta nos preços de alimentos e da gasolina, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), considerado a inflação oficial do país, subiu 0,24% em agosto, abaixo da taxa de 0,36% registrada em julho, conforme divulgou nesta quarta-feira (9) o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Apesar da desaceleração em relação ao mês anterior, trata-se da terceiro avanço seguido e o maior resultado para um mês de agosto desde 2016, quando o IPCA foi de 0,44%. Em agosto de 2019, a taxa havia sido de 0,11%.
No acumulado em 2020, o IPCA registra alta de apenas de 0,70%, e em 12 meses, de 2,44%, ainda abaixo do piso da meta do governo para o ano, que é de 2,5%.
O resultado ficou ligeiramente acima da mediana das projeções de 33 analistas de consultorias e instituições financeiras consultados pelo Valor Data, que projetaram desaceleração do índice para 0,23% em agosto. O intervalo das estimativas ia de 0,17% a 0,32% de aumento.
O que mais pesou
Dos 9 grupos de produtos e serviços pesquisados, 6 tiveram alta em agosto. Os maiores avanços foram nos preços de transportes (0,82%) e de alimentação e bebidas (0,78%), com impactos de 0,16 e 0,15 ponto percentual, respectivamente, no índice geral.
Em julho, os preços de alimentação e bebidas tinham registrado variação de apenas 0,01%.
Entre os itens que mais subiram em agosto, estão o tomate (12,98%), óleo de soja (9,48%) o leite longa vida (4,84%), frutas (3,37%), carnes (3,33%), e o arroz (3,08%).
“O arroz acumula alta de 19,25% no ano e o feijão, dependendo do tipo e da região, já tem inflação acima dos 30%. O feijão preto, muito consumido no Rio de Janeiro, acumula alta de 28,92% no ano e o feijão carioca, de 12,12%”, destacou o gerente da pesquisa, Pedro Kislanov.
Alimentos com alta acumulada expressiva no ano:
- manga: 61,63%
- cebola: 50,40%
- abobrinha: 46,87%
- tainha: 39,99%
- limão: 36,56%
- morango: 31,99%
- feijão-preto: 28,9%
- leite longa vida: 22,99%
- arroz: 19,25%
- óleo de soja: 18,63%
Entre as razões para o aumento nos preços dos alimentos está a alta do dólar e o aumento da demanda externa, com elevação das exportações, de produtos como arroz, estimuladas pelo real mais desvalorizado.
De acordo com o pesquisador do IBGE, o auxílio emergencial também teve impacto sobre a inflação no mês. “Houve um efeito demanda que ajudou a manter esses preços dos alimentos mais altos”, avaliou Kislanov.
O IBGE destacou, ainda, que os preços relacionados à alimentação no domicílio acumulam alta de 11,39% em 12 meses, variação mais alta desde novembro de 2016, quando foi de 11,57%.
Veja as taxas de variação por grupos
- Alimentação e Bebidas: 0,78%
- Habitação: 0,36%
- Artigos de Residência: 0,56%
- Vestuário: -0,78%
- Transportes: 0,82%
- Saúde e Cuidados Pessoais: 0,50%
- Despesas Pessoais: -0,01%
- Educação: -3,47%
- Comunicação: 0,67%
Transportes tiveram alta pelo 3º mês consecutivo
Nos combustíveis, a gasolina teve alta de 3,22% em agosto, enquanto o diesel subiu 2,49% e o etanol avançou 1,29%.
“O impacto individual mais importante nestes últimos meses tem sido a gasolina. Embora ela continue sendo o item individual de maior peso, a alimentação segue a que tem o maior peso na composição do IPCA”, explicou Kislanov.
No acumulado no ano, porém, a gasolina ainda tem queda de 5,93%.
Nas despesas de casa (habitação), os maiores impactos vieram do aluguel residencial (0,32%) e da energia elétrica (0,27%). Houve também aumento nos preços de materiais de construção como o tijolo (9,32%) e o cimento (5,42%).
Em comunicação (0,67%), o destaque ficou com o subitem acesso à internet (8,51%), com impacto de 0,05 p.p. no índice do mês.
Descontos nas mensalidades escolares ajudam a frear inflação
No lado das quedas, o destaque ficou com o grupo Educação, que teve deflação de 3,47% em agosto, favorecida pelos descontos nas mensalidades escolares em meio à pandemia e em virtude da suspensão das aulas presenciais.
“Não fossem os cursos regulares, nós teríamos uma alta de 0,48% [no IPCA] em agosto”, afirmou o gerente da pesquisa.
Os preços dos cursos regulares recuaram 4,38%, sendo que maior queda foi observada na pré-escola (-7,71%), seguida pelos cursos de pós-graduação (-5,84%), pela educação de jovens e adultos (-4,80%) e pelas creches (-4,76%).
Segundo Kislanov, a queda na educação se deu porque os preços das mensalidades dos cursos em agosto foram comparados com os que estavam vigentes no começo de março. Isso porque, em função da pandemia, não foi feita coleta desses preços entre julho e abril.
“Durante o período de pandemia e até o momento, muitas instituições de ensino concederam desconto nas mensalidades. A gente não coletou esses preços de abril a julho, por isso essa queda concentrada agora no mês de agosto. A partir de setembro a gente não deve ter mais essa influência no índice”, explicou.
As peças de vestuário (-0,78%) também registraram deflação, com uma queda ainda mais intensa que a registrada em julho (-0,52%).
Campo Grande tem maior inflação entre as regiões
Cinco das 16 regiões pesquisadas pelo IBGE apresentaram deflação em agosto. O menor índice ficou com o município de Aracaju (-0,30%). Já o maior resultado foi observado em Campo Grande (1,04%). Em São Paulo, a taxa foi de 0,31%. Já no Rio de Janeiro houve deflação de 0,13%.
O IPCA é calculado com base em uma cesta de consumo típica das famílias com rendimento um a 40 salários mínimos, abrangendo dez regiões metropolitanas, além dos municípios de Goiânia, Campo Grande, Rio Branco, São Luís, Aracaju e Brasília.
INPC ficou em 0,36%, maior resultado desde 2012
Já o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que se refere às famílias com rendimento de um a cinco salários mínimos e é utilizado como referência para reajustes salariais e benefícios previdenciários, apresentou alta de 0,36% em agosto, sendo o maior resultado para o mês desde 2012 (0,45%).
No ano, o INPC acumula alta de 1,16% e, nos últimos doze meses, de 2,94%.
Perspectivas e meta de inflação
Apesar da forte alta observada nos preços de itens da cesta básica, a expectativa de inflação para este ano segue bem abaixo da meta central do governo, de 4%, e também do piso do sistema de metas, que é de 2,5% em 2020.
Os analistas das instituições financeiras projetam uma inflação de 1,78% em 2020, conforme a última pesquisa Focus do Banco Central.
O IBGE evitou fazer projeções sobre a dinâmica de preços dos alimentos nos próximos meses.
“Enquanto tem alimentos em alta, tem outros em queda. O consumidor acaba percebendo mais a alta e essa percepção está relacionado ao hábito de consumo. O que a gente pode dizer é que tem alguns fatores que estão influenciando essa alta, que é o câmbio mais alto, que acaba estimulando as exportações, e do outro lado o auxílio emergencial, que no início foi fundamental para garantir a demanda por alimentos básicos como o arroz e o feijão”, afirmou gerente da pesquisa.
A meta de inflação é fixada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Para alcançá-la, o Banco Central eleva ou reduz a taxa básica de juros da economia (Selic), atualmente em 2% – mínima histórica. O mercado segue prevendo manutenção da taxa básica de juros neste patamar até o fim deste ano.
Pela regra vigente, o IPCA pode oscilar de 2,5% a 5,5% sem que a meta seja formalmente descumprida. Quando a meta não é cumprida, o BC tem de escrever uma carta pública explicando as razões.
A inflação sentida por muitas famílias no ano, no entanto, tem ficado acima do IPCA. O índice da FGV que mede a variação de preços de produtos e serviços para famílias com renda entre um e 2,5 salários-mínimos, por exemplo, acumula alta de 3,08% nos últimos 12 meses.
Fonte: G1