Sempre levei uma vida completamente normal. Mas, certo dia, quando estava para me formar na faculdade, me dei conta, de repente, de que eu não era mais o mesmo. Lembro de ter sentido na hora a presença do diferente, já havia começado a transição da familiaridade para o estranhamento.
Como se o que fui não fizesse parte de meu presente. Acho que, no início, esse desvio era tão insignificante que eu não conseguia nem percebê-lo. Mas, com o tempo, foi se tornando cada vez maior, até me sentir transportado a um lugar onde minha imagem original se desvirtuava.
Talvez estivesse no limite de uma mudança, de um crescimento pessoal. Até que grau de distorção poderia continuar sendo eu mesmo com a formatura, com o novo trabalho, com o casamento?
Até que grau de distorção mantenho o que fui? Durante quanto tempo o rosto de meu pai, que passou nove anos inconsciente, se distanciando na doença e na morte, continua reconhecível? Onde está a fronteira atrás da qual um “eu” deixa de ser um “eu”?
*João é natural de Salvador, onde reside. Engenheiro civil e de segurança do trabalho, é perito da Justiça do Trabalho e Federal. Neste espaço, nos apresenta o mundo sob sua ótica. Acompanhe semanalmente no site www.osollo.com.br.