Quando se vê a miséria e a dor, é preciso ser louco, cego ou covarde para se resignar a pandemia. Alguns neste momento, já tomaram a vacina, estão deixando para trás a grande dor de todos nós, que é a incerteza na saúde.
Com a picada da agulha não sentem nada, mas, na alma, sentem renascer a vitalidade saindo de uma vida presa pelo vírus, e esta metamorfose divide o mundo. Dentro de pouco tempo alguns poderão apertar num abraço seus entes queridos. Essa faculdade de dar um sentido solene e alto aos gestos humanos no abraço e no beijo.
Após a vacina emerge um mundo em que tudo é possível, mas é gradual esta metamorfose. Todos teremos a continuidade da vida livre de que estávamos acostumados, os dias vão passando, vejo filas para vacinação de idosos acima de 85 anos, estão em um novo florescer, do lado correto do viver, que é a liberdade plena.
A frente temos um destino desconhecido, atrás: o passado de inquietações. Esta noite, enquanto observo pela janela a escuridão tocar a cidade e as luzes surgirem como vaga-lumes no campo de edifícios que se estendem diante de mim, minha mente esta presa em outro tempo, outro lugar lembrando que este fevereiro não teremos danças nas ruas, apenas o silêncio do carnaval.
Então, de súbito, desejo paz e que tantas mortes, mais de duzentos e trinta e três mil se transformem em um profundo pensar, uma espécie de estrela de amor e de tristeza. Como se o coração tivesse sido aberto por uma corrente de solidariedade. Ainda não aprendemos como a vida será, mas a corrente de cada sonho interrompido, sufocado pela pandemia, esteja nítido na alma de todos nós.
Sabendo que a vida de cada vítima é bem mais que palavras e histórias.
*João é natural de Salvador, onde reside. Engenheiro civil e de segurança do trabalho, é perito da Justiça do Trabalho e Federal. Neste espaço, nos apresenta o mundo sob sua ótica. Acompanhe no site www.osollo.com.br.