“Se tão-somente fosse atendido o meu pedido, se Deus me concedesse o meu desejo, se Deus se dispusesse a esmagar-me, a soltar a mão protetora e eliminar-me!” (Jó 6.8-9)
Não sabemos há quanto tempo Jó está sofrendo, mas já está sofrendo tempo bastante para desejar intensamente que Deus lhe conceda alívio. Ele quer morrer. As condições a que chegou lhe dizem que é o fim da linha. Chegou ao fundo do poço. Perdeu bens, família, saúde e Deus está em silêncio. Por fim seus amigos que lhe fizeram tão bem com o silêncio inicial, agora o oprimem com suas palavras “bem intencionadas”.
Jó é como qualquer pessoa: esgotadas as forças por uma dor intensa e de longo prazo, é natural que deseje morrer. Mas Jó é diferente de muitos: a sua vida não pertence a ele, mas a Deus. Ele depende de Deus para morrer. Morrerá quando e se Deus quiser. Mas Jó está percebendo que Deus não entendeu que já chegou seu tempo. E então lamenta: “se tão-somente fosse atendido meu pedido”. Ele não quer que Deus o proteja. Ele prefere outro tipo de proteção, que Deus não lhe está dando. Então deseja que a “mão protetora” de Deus se recolha. Tudo isso nos dá uma dimensão da dor de Jó. Mas também nos dá uma dimensão do quanto Jó pertence a Deus.
É de Deus última palavra, mas Jó também se sente no direito de falar. E ele fala o que sente. Sua relação com Deus não é religiosa nem política. É real. Ainda que aos pedaços, ele está inteiro nessa relação. E isso é muito belo. O Deus que deu e tirou agora se cala. Mas ainda é o Deus de Jó. Jó está se sentido destruído, esgotado, sozinho e mal acompanhado, mas ainda é o Jó de Deus. Sua dor é tão grande quando é sua fé e submissão. Sua história é tão trágica como bela. Deus, o Diabo, um homem ferido, amigos incompreensíveis, silêncio e lentidão. Jó está sendo sustentado por um fio amarrado no mais íntimo do seu ser: a certeza de que pertence a Deus.