- “O Senhor é o meu pastor; de nada terei falta.” (Salmos 23.1)
Os salmos são textos para o coração, em primeiro lugar. Somente depois é que são textos para a mente. Ler os salmos nos pede o coração à frente da mente. Eles não deveriam ser avidamente analisados por nossa mente grega, cartesiana. O melhor é que sejam apaixonadamente sentidos, em imitação ao coração prontamente ávido da cultura judaica. A piedade, o temor, a sensibilidade são caminhos melhores para nos alimentarmos deles. Pois os salmos são textos das entranhas e não do cérebro. Os salmista não estão tentando esclarecer verdades, explicar a vida, transmitir um conceito. Eles estão expondo a si mesmos, revelando seus sentimentos. Querem ser ouvidos por Deus e não se importam se pessoas escutarem. Acometidos pela vida, ora por tristeza, ora por alegria, em medo ou confiança, abatidos por frustração ou cheios empolgação, eles falam a Deus, falam de Deus e falam de si. Talvez mais do que em qualquer outro lugar das Escrituras, nos salmos precisemos de simpatia como instrumento de compreensão. Precisamos calçar os sapatos dos salmistas para ouvirmos os seus textos.
Neste salmo Davi provavelmente está escrevendo de um momento de sossego e paz. Ele não era salmista somente na dor e necessidade. Ele continua salmista quanto tudo vai bem. Talvez o momento fosse depois de unificado o reino, construído seu palácio, superados os adversários e as dificuldades, que foram tantas no começo de seu reinado. Mas ele superou todas e se tornou o rei que jamais pensou ser. E também o rei que tanto seu povo desejava. Mas o coração de pastor de ovelhas, do tempo das orações, cânticos e poemas, do encontro com leões, ursos e gigantes… aquele coração singelo e livre, ainda batia em seu peito. E é com ele que Davi faz salmos. Ele o preferiu ao de rei, por isso não diz “o Senhor é o meu rei”, e sim “o Senhor é o meu pastor”. Um rei lembra poder, força, grandeza. Um pastor, amor, cuidado, proximidade. Davi sabia do poder de Deus e foi instrumento desse poder várias vezes. Mas o que o encantava era o amor e o cuidado pastoral de Deus. Ele não quer ser soldado, prefere ser ovelha do Pastor Divino. E tem certeza: “de nada terei falta”.
Quem é você para Deus e quem é Deus para você? Esse salmo é um convite à confiança em Deus. Deus é o pastor que cuida e guarda. Seja nos momentos em que nos sentirmos sozinhos e frágeis, quando o pior que tanto temíamos, acontece; ainda assim podemos dizer: o senhor é o meu pastor, de nada terei falta! Sim, podemos. Diante do pior e mais difícil, podemos desembainhar a espada da fé e dar um golpe fatal no inimigo que nos alimenta a incredulidade. Mas, e quando tudo está bem? E quando ganhamos, vencemos, a vida nos parece bela e boa, e tudo parece perfeito e o sorriso brota fácil? As vezes sem necessidades nos descuidamos da fé. Mas não deveríamos. Este salmo provavelmente brotou da bonança e não da tribulação! Lembre-se: tudo aqui pode falhar. Seja em necessidade, seja em abundância, seja na dor ou na alegria, escolha ser ovelha do Pastor Divino. E, seja lá como estiver ou venha a estar seu dia hoje, confirme sua fé. Não abra mão da certeza de que o Senhor é o seu pastor e de que, por Sua graça e misericórdia, nada lhe faltará.