Cartórios chegam a faturar R$ 50 mil por mês na Bahia

Muito dinheiro está em jogo na privatização do serviço no estado

O velhinho ranzinza Ebenezer Scrooge, personagem milionário do livro Um Conto de Natal, virou símbolo da avareza nas mãos do escritor inglês Charles Dickens, em 1843. Apesar de ser dono de uma fortuna, Scrooge vivia sem luxo. A história do unha de fome é muito parecida à dos 1.549 cartórios extrajudiciais da Bahia.

O serviço é ruim, o atendimento se arrasta, as paredes, cheias de infiltrações, escoram pilhas e mais pilhas de documentos. Mas, apesar da pindaíba disfarçada, como Scrooge, os cartórios baianos valem uma boa grana. Segundo levantamento realizado pelo Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Estado da Bahia (Sinpojud), as 174 unidades que mais faturaram em 2010 arrecadaram em média R$ 643.678 no ano – mais de R$ 53 mil por mês.

Segundo dados do Sistema de Informações Contábeis e Financeira (Sicof), da Secretaria da Fazenda do Estado da Bahia, os cartórios levaram

R$ 142 milhões aos cofres do Tribunal de Justiça da Bahia em 2010. Se o valor for dividido igualmente pelos 1.549 postos do estado, cada um fatura R$ 91.672 por ano.

Esse é o cenário da briga entre oficiais e tabeliães, deputados estaduais, governo e Tribunal de Justiça (TJ), que discutem o modelo de privatização dos cartórios baianos. O Projeto de Lei 18.324/09, que trata do assunto, está previsto para ser votado amanhã na Assembleia Legislativa.

FUTURO

Apesar da promessa do TJ de manter os preços dos serviços após a privatização, em Pernambuco, por exemplo, onde o Judiciário não controla os cartórios, há unidades de protestos de títulos que faturam R$ 800 mil por mês.

Na trincheira da toga, o desejo é de que o serviço seja privatizado aos poucos. “Todas as despesas são garantidas pelas custas judiciárias. O TJ quer transição com parcimônia, para não nos arrependermos”, argumenta a presidente do tribunal, Telma Britto.

O governador Jaques Wagner engrossou o caldo dos comedidos. “É preciso primeiro que se faça a conta, porque o governo não tem orçamento para aumentar a remessa para os outros poderes”.

No outro lado, deputados e servidores caminham ombro a ombro. Eles querem privatização imediata e que os oficiais e tabeliães possam optar por pedir exoneração do cargo e assumir automaticamente a chefia dos cartórios, tornando-se empresários. “O melhor é fazer o que a Constituição manda: privatizar e dar opção ao servidor”, afirmou a presidente do Sinpojud, Maria José Silva.

Faturamento Até em unidades do interior do estado, onde o movimento é menor que na capital, oficiais já esfregam as mãos. Rufino Griffo Ribeiro, titular do Cartório de Registro Civil com Funções Notoriais do distrito de Posto da Mata, em Nova Viçosa, no Extremo Sul, quer virar empresário. Ele fatura em média R$ 200 mil ao ano. Com a privatização, espera dobrar a cifra. “Muita gente vai para cartórios de Minas Gerais. Espero faturar R$ 400 mil e contratar oito funcionários”, planeja.

A avareza de Scrooge só desapareceu após ele ser visitado pelos espíritos dos natais passados. A população espera que a privatização faça o mesmo nos cartórios.

Arrecadação de R$ 800 mil por mês em PE

Em Pernambuco, os cartórios nunca foram mantidos pelo Tribunal de Justiça (TJ-PE). Segundo o corregedor-geral do tribunal, desembargador Bartolomeu Bueno, cartórios de protesto de títulos faturam cerca de R$ 800 mil por mês. Ele afirma que os cartórios são um excelente negócio. “Chega a ser uma renda que poucos empresários têm. O que eles (os titulares dos cartórios) recebem é uma fortuna”, diz.

Os preços cobrados à população são bem diferentes aos da Bahia. Para registrar um loteamento em Pernambuco, é preciso pagar R$ 46,15 por lote. Na Bahia, o serviço custa R$ 7. Uma procuração simples sai por R$ 46,15 no estado vizinho. Aqui, fica por R$ 13,90. O reconhecimento de firma lá custa R$ 2,79. Na Bahia, R$ 1,30. O TJ baiano afirma, porém, que os preços atuais serão mantidos.

MINA DA BUROCRACIA

– 600 mil reaisfoi o faturamento em 2010 das 174 unidades que mais faturaram na Bahia – são mais de R$ 50 mil por mês.

– 100% de aumento na arrecadação, é o que espera um titular de cartório na Bahia com a privatização do serviço.

– 800 mil reais é a arrecadação mensal de cartórios de protesto de títulos em Pernambuco, onde eles são privatizados.

– 46,15 reais é o preço cobrado para a emissão de uma procuração simples no estado de Pernambuco.

– 13,90 reais é quanto os baianos pagam por uma procuração simples. O valor é 28% mais barato que o de Pernambuco.


Fonte: Bruno Villa e Leo Barsan / Correio da Bahia

 

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui