Brinquedos

Brinquedos

Minha infância em Porto Seguro, eu era um menino de cócoras, no fundo do quintal de nossa casa, conhecida pelos moradores como a “casa do juiz”, brincando com os meus carrinhos. Eu tinha carrinhos de lata, pintados de vermelho e amarelo. Outros feitos por mim, com rodas de carretel.

Eu era grande em relação a eles, e era um deus, porque fazia seus destinos. De cócoras, imensamente maior que eles, falando sozinho, para dar um enredo à brincadeira. Lembro que uma vez chovia, minha mãe gritava, chamando-me. E eu respondia: – Já vooouuu!
– Mas você não vê que está chovendo?
– Ah, aqui está tão bonzinho!
Daí a pouco, vinha lá de dentro uma pessoa maior que eu, muito maior que os carrinhos consequentemente, maior que um deus, e me arrastava pelo braço. Os carrinhos ficavam na chuva, morrendo. É triste a morte dos brinquedos. Todos os meus brinquedos morreram na chuva. Uns de ferrugem, outros se descolaram. Todos os meus brinquedos viveram pouco.

Lembranças sem forma e sem cor , sem cheiro e sem sons. É. Deve ser a infância, toda ela que se perdeu sem que eu pudesse fazer nada. Um gesto sequer de defesa. A infância que me visita e as aceito, como um todo, certo apenas de que foi menino. Da minha vida , o que foi que eu fiz? As minhas palavras, os meus gestos, os meus silêncios, as minhas iras, a minha tristeza – ninguém ouve, ninguém entende. Perdi a razão e todas as mortes me cercam, muito atentas. Estou pleno de um mistério vão, que não serve a ninguém, nem me salva, nem me redime, nem atenua meus defeitos. Onde e como encontrarei outra vez aquele grito interior da alegria?

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