BC lançará pagamentos instantâneos em 2020, sem cartão e com uso de blockchain

 

ROTATIVO DO CARTÃO DE CRÉDITO
Blockchain permite transações em poucos segundos e sem necessidade de intermediários Foto: Marcos Santos/USP Imagens
O Banco Central anunciou que deve lançar em novembro de 2020 um sistema de pagamentos instantâneos. O assunto já era ventilado pela instituição desde dezembro de 2018, quando o BC emitiu comunicado estabelecendo parâmetros para o chamado ecossistema de pagamentos instantâneos brasileiro.

O objetivo da instituição é substituir, gradualmente, o uso de ferramentas como Transferência Eletrônica Disponível (TED) e Documento de Ordem de Crédito (DOC), que têm compensação mais lenta e altos custos. Uma das possibilidades é criar um nome de usuário para cada pessoa —que pode ser um login ou o próprio número de CPF do cliente. Isso acaba com a exigência de inserir, a cada transferência realizada, dados como nome completo, CPF, número de banco e de agência.

Outra possibilidade do sistema de pagamentos é a subsitutição de cartões de crédito. A compra será realizada por leitura de QR Code pelos celulares, seguindo a tendência mundial. Após a leitura do código, o cliente deve autorizar a transação pelo aparelho. A autorização pode ser feita por meio de identificação biométrica, com leitura da digital dos dedos, ou por uma selfie. Se o sistema reconhecer que a operação é legítima, o dinheiro é enviado em poucos segundos ao vendedor ou prestador de serviço.

A plataforma deve funcionar com base no blockchain, uma ferramenta que é utilizada no universo das criptomoedas mas que está, aos poucos, sendo levada para as instituições financeiras.

O blockchain — ou cadeia de dados, em tradução literal — é uma plataforma eletrônica que funciona como um livro de registros de transações financeiras ou informações de forma geral. Todas as instituições inseridas na cadeia têm acesso às informações compartilhadas pelas integrantes, sem necessidade de um intermediário. A base de dados é descentralizada, ou seja, alimentada e hospedada por todos os participantes. Enquanto houver pelo menos um integrante na cadeia, as informações estão armazenadas e não podem ser alteradas.

De acordo com o Banco Central, o desenvolvimento da base de dados deve custar aproximadamente R$ 4,3 milhões, enquanto a manutenção está estimada em R$ 1,2 milhão ao ano. Em abril de 2019, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou que a implantação de um ecossistema para pagamentos instantâneos estava “próxima de ocorrer”.

Como funciona o sistema de pagamentos instantâneos

Em transferências bancárias convencionais entre diferentes instituições, o valor é repassado de forma indireta pelo Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB). Esse é o caso da Transferência Eletrônica Disponível (Ted) e do Documento de Ordem de Crédito (Doc). Além de terem custos relativamente altos — um Doc pode custar R$ 10,50 —, as duas modalidades dependem do expediente bancário e podem ser compensadas apenas no dia útil subsequente, dependendo do horário da transação.

O mesmo se aplica às transações que envolvem cartão de crédito. As instituições responsáveis pelas maquininhas e pelas bandeiras dos cartões atuam como intermediárias. No caso de compras parceladas, por exemplo, o lojista recebe o pagamento da bandeira do cartão. Caso o cliente não pague a fatura, a dívida, portanto, não é com o comércio: é com a operadora.

No sistema de pagamentos instantâneos, porém, os valores são transferidos em poucos segundos diretamente ao destinatário e o sistema funciona de forma ininterrupta, 24 horas por dia 7 dias por semana. Além disso, cada instituição tem uma identificação própria no sistema financeiro, como um login. Isso pode ser um QR Code, um nome de usuário ou o próprio CPF da pessoa ou CNPJ da instituição. Com isso, não é necessário memorizar ou anotar dados bancários para realizar uma transação.

A fintech brasileira Spin Pay, criada em julho de 2018, deve lançar no fim de outubro a primeira plataforma de pagamentos instantâneos do Brasil, eliminando a necessidade de usar cartões para realizar compras no comércio eletrônico.

De acordo com Alan Chusid, co-criador da Spin Pay, o pagamento por meio de QR Code já é uma realidade no Brasil. Ele afirma que o problema é que não há uma padronização dos códigos, impedindo transações entre diferentes atores do mercado. “O QR Code do Nubank não conversa com o do Itaú, que não conversam com os outros. É só entre a mesma instituição”, explica. A novidade é que os códigos devem funcionar de forma unificada entre todos os atores do sistema financeiro, como bancos, pessoas físicas e comerciantes.

A fintech não se trata de um novo aplicativo ou carteira digital, em que é necessário depositar valores para realizar as compras: a empresa será responsável pelo desenvolvimento do sistema, que enviará notificações nos aplicativos dos próprios bancos para que o cliente autorize a transação comercial.

Chusid afirma que por questões estratégicas ainda não é possível divulgar quais serão as empresas parceiras, mas diz que a rede inclui pelo menos 30 empresas, entre “varejistas de setor aéreo, de transporte, de moda, alimentação, mobilidade e alguns dos principais bancos digitais do Brasil”.

O principal financiador da fintech é o Canary, fundo paulistano criado com recursos de gigantes da tecnologia como Instagram, Nubank e 99 que ajuda empresas a enfrentarem o chamado ‘vale da morte’, período entre a captação de um investidor anjo e a primeira rodada de capital de risco.

O Canary foi fundado em janeiro de 2017 e, no primeiro ano de funcionamento, investiu mais de R$ 160 milhões em pelo menos vinte startups brasileiras, como a Volanty, que faz compra e venda de carros usados, e a Social Miners, que atua na análise de dados de e-commerce.

Alan Chusid acredita, porém, que a curto prazo a criação de um Sistema de Pagamentos Instantâneos não deve significar a imediata queda de arrecadação dos bancos e financeiras. “Cartão não vai morrer, Ted não vai morrer, pelo menos por enquanto”, imagina.

Para ele, o lento avanço das tecnologias do sistema financeiro se deve à hegemonia de instituições tradicionais na área. “O problema é que toda a infraestrutura básica transacional, todos os produtos de cartões a boletos e saques, eram dos cinco grandes bancos. Os pequenos sempre estão usando as soluções dos grandões”, explica.

Rede Blockchain do Sistema Financeiro Nacional

De acordo com uma pesquisa divulgada pela PwC em 2018, até 2030 de 10% a 20% dos processos econômicos em todo o mundo serão processados em cadeias de blockchain.

No Brasil, a transição para o modelo já teve início também nas instituições bancárias ditas tradicionais. A Federação Brasileira das Associações de Bancos (Febraban) lançou em junho deste ano a Rede Blockchain do Sistema Financeiro Nacional, parceria com a Câmara Interbancária de Pagamentos (CIP) que conta com a presença de empresas como Bradesco, Banco do Brasil e Sicoob.

Joaquim Kiyoshi Kavakama, superintendente geral da CIP, explica que em 2016 a Comissão de Tecnologia da Febraban criou um grupo de trabalho para discutir a questão e, em junho de 2019, a ferramenta Device ID entrou em funcionamento. O serviço é uma rede de compartilhamento de informações sobre dispositivos móveis Quando um cliente tiver seu celular perdido ou roubado, por exemplo, pode comunicar a uma das instituições financeiras.

O grupo formado pela Febraban e pela CIP também estuda criar um sistema semelhante a dos pagamentos instantâneos.  “Quando um banco ou uma instituição de pagamentos faz o cadastro do cliente e publica isso numa rede blockchain, todas as instituições já têm à disposição para onde vai fazer aquele pagamento”, explica.

Outra possibilidade é o uso do blockchain para remessas internacionais. Esse tipo de transação financeira pode levar dias ou até semanas para ser concretizada no sistema de compensação convencional, em que o dinheiro vai sendo repassado por bancos intermediários até chegar ao local de destino.

Fonte: Estadão

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