“O segundo domingo de maio é consagrado às mães, em comemoração aos sentimentos e virtudes que o amor materno concorre para despertar e desenvolver no coração humano, contribuindo para seu aperfeiçoamento no sentido da bondade e da solidariedade humana.”
Assim declara o decreto de número 21.366, assinado pelo então presidente Getúlio Vargas (1882-1954) e publicado em 5 de maio de 1932.
O documento ainda tece três considerações para justificar a lei: “que vários dias do ano já foram oficialmente consagrados à lembrança e à comemoração de fatos e sentimentos profundamente gravados no coração humano”; “que um dos sentimentos que mais distinguem e dignificam a espécie humana é o de ternura, respeito e veneração, que evoca o amor materno”; e “que o Estado não pode ignorar as legítimas imposições da consciência coletiva, e, embora não intervindo na sua expressão, e do seu dever reconhecê-las e prestar o seu apoio moral a toda obra que tenha por fim cultuar e cultivar os sentimentos que lhes imprimem, força afetiva de cultura e de aperfeiçoamento humano”.
Mas o modelo da efeméride brasileira foi copiado dos Estados Unidos, conforme atestam pesquisadores. “Apesar de já existirem manifestações inclusive na Grécia Antiga e em outros países, o Dia das Mães como é visto hoje foi uma criação americana, do fim do século 19”, afirma o psicólogo social Sérgio Silva Dantas, professor de marketing da Universidade Presbiteriana Mackenzie
Se a data foi oficializada no Brasil em 1932, sua consolidação veio mesmo na época do regime militar de 1964 a 1985.
“Copiava-se tudo dos Estados Unidos e houve, durante a ditadura houve uma valorização enorme da família e das mães, em particular”, diz a historiadora Mary Del Priore, autora de História das Mulheres no Brasil. “A maternidade bem vivida, a mulher dedicada aos filhos era um perfil exaltado em concurso, valorizado e que ganhava capas de revista”, lembra.
Anna Jarvis
A norte-americana Anna Maria Jarvis (1864-1948) é considerada a idealizadora do modelo contemporâneo do Dia das Mães. Em 1905, ela perdeu a mãe e, profundamente deprimida, resolveu militar por uma data que homenageasse o sentimento materno.
Conforme conta o professor Dantas, a tal mãe, que também se chamava Anna, era reconhecida como uma “grande mãezona” na comunidade onde vivia, no estado americano da Virgínia Ocidental. “Participante da Igreja Metodista, ela desenvolvia uma série de trabalhos sociais”, conta o pesquisador. Assim, sua morte gerou comoção.
A celebração criada pela filha – uma mulher solteira e sem filhos – foi ganhando grandes proporções. “Ganhou repercussão muito grande, mesmo em tempos em que não havia redes sociais. Viralizou. Tanto que o presidente da época resolveu oficializar o segundo domingo de maio como o Dia das Mães em todo o país”, relata o professor. Na época, o presidente americano era Woodrow Wilson (1856-1924).
No Brasil
Mas se a data foi oficializada apenas em 1932 no Brasil e ganhou forte apelo comercial décadas mais tarde, Dantas conta que já havia comemorações anteriores no País. “Segundo minhas pesquisas, havia homenagens principalmente ligadas a igrejas, em boa parte das igrejas cristãs”, diz ele. “Em maio se comemora o mês de Maria, a mãe de Jesus, então já se faziam associações ao papel da mãe.”
Há registros de que em 12 de maio de 1918 ocorreu uma celebração dedicada ao Dia das Mães no Rio Grande do Sul, por iniciativa da Associação Cristã de Moços. Já a Igreja Católica, no Brasil, acabou incorporando a tradição em 1947, por iniciativa do então cardeal-arcebispo do Rio de Janeiro, D. Jaime de Barros Câmara (1894-1971).
Segundo o professor do Mackenzie, a oficialização feita por Getúlio Vargas em 1932 atendeu a apelos da população. Era um momento de valorização da mulher como cidadã e, na ótica da época, seu papel materno precisava ser ressaltado também. “Foi mais ou menos nesse período que as mulheres começaram a ter direito a voto”, exemplifica o professor. “Vargas queria fazer uma ação junto ao público feminino.”
Da celebração para o cunho comercial, o salto foi natural. “Não demorou muito para a data ser associada à questão comercial, uma vez que na cultura ocidental tudo o que é comemoração está muito ligada ao consumo e, de alguma forma, trocamos presentes”, contextualiza. “Não há grandes registros históricos sobre como isso foi se desenvolvendo, mas o que se sabe é que o comércio começou a visualizar no Dia das Mães uma grande oportunidade.”
O Dia das Mães é a segunda data mais importante do comércio brasileiro, perdendo apenas para o Natal. “Supera o Dia dos Namorados, dos Pais e das Crianças, até pelo apelo emocional e sentimental que as mães representam”, afirma Dantas.
Mas o reinado está um pouco ameaçado nos últimos anos por uma data bem menos afetiva. “Hoje há uma certa concorrência da ‘Black Friday’ na disputa do segundo lugar. Para alguns produtos, a ‘Black Friday’ já é mais importante”, analisa Marcel Solimeo, superintendente institucional da Associação Comercial de São Paulo.
“Mas consideramos que a ‘Black Friday’ é uma antecipação das compras de Natal, ou seja, os consumidores aproveitam as promoções de novembro para comprar os presentes de fim de ano”, complementa ele.
“Já o Dia das Mães é uma data que representa um adicional significativo no primeiro semestre, sendo sem dúvida alguma a data comercial mais importante da primeira metade do ano. Para alguns segmentos, em especial os artigos de uso pessoal, o Dia das Mães é mais importante do que a ‘Black Friday’.”
Solimeo diz que a data foi ganhando espaço no calendário comercial brasileiro “porque apoia-se muito no apelo emocional, na importância que a figura materna tem em nossa cultura”.
“Por isso acabou ganhando grande importância para o varejo. E os lojistas sempre usaram o Dia das Mães para – além de vender vestuário e artigos de uso pessoal (como perfumes, joias, maquiagem, bolsa) – comercializar eletrodomésticos”, exemplifica.
“Sempre se vendeu a ideia de que o presente para a mãe é um presente para o lar. Assim, o segmento de móveis e eletrodomésticos historicamente tem um desempenho muito bom no Dia das Mães”, analisa o superintendente.
“Hoje a narrativa é um pouco diferente, mas ainda assim as lojas continuam a usar a data para vender móveis e eletrodomésticos, até porque, se não for no Dia das Mães, só no final do ano haveria uma boa oportunidade para comercializar esses produtos de maior valor.”
De acordo com levantamento realizado pela Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo (Facesp), o crescimento nas vendas previsto para este ano em comparação ao anterior é de 2% a 3%.
Pelo mundo
Na antiguidade, a valorização da maternidade era concomitante ao início da primavera. Há registros de que, na Grécia Antiga a entrada da estação era festejada em honra a Reia, a mãe dos deuses.
Mas a data celebrada no Brasil e nos Estados Unidos – o segundo domingo de maio – não é unanimidade em todo o mundo contemporâneo.
Comemoram nesta data também países como África do sul, Chile, China, Dinamarca, Austrália, Itália, Japão, Cuba, Venezuela, Finlândia, Bégica e outros. Em Portugal, por outro lado, a celebração ocorre no primeiro domingo de maio – assim como em Angola, Moçambique, Espanha, Cabo Verde, Hungria e Lituânia.
Noruegueses dedicam às mães o segundo domingo de fevereiro. Franceses e suecos, o último domingo de maio. Na Argentina e na Bielorrússia, o que vale é o terceiro domingo de outubro.
Tanto na Palestina como no Líbano, preserva-se o costume ancestral: Dia das Mães coincide com o primeiro dia da primavera.
Alguns países têm datas fixas para o Dia das Mães, independentemente do dia da semana. Na Bolívia, por exemplo, é o dia 27 de maio. Rússia, Sérvia, Montenegro, Romênia e Bulgária preferem o 8 de março.
Na Eslovênia, é dia 25 de março. Egito, Síria e alguns países árabes homenageiam as mães em 21 de março. Bélgica e Costa Rica usam o 15 de agosto, mesmo dia em que católicos celebram a Assunção de Nossa Senhora. Na antiga Iugoslávia, a comemoração era feita sempre duas semanas antes do Natal.
Fonte: BBC Brasil