Ao que tudo indica, até o final do ano, o mundo vai contar com uma vacina capaz de combater os quatro sorotipos de dengue. A novidade está em fase de avaliação
A partir de setembro deste ano, o mundo poderá dispor de uma vacina capaz de imunizar a população contra os quatro sorotipos de vírus que causam a dengue, inclusive na sua manifestação mais grave: a hemorrágica.
Tudo dependerá do resultado da avaliação que a comissão de experts no assunto, escolhida pela Organização Mundial de Saúde (OMS), fizer do produto imunizante desenvolvido pelo laboratório Sanofi Pasteur e que é o único a se encontrar na fase clínica.
Entre os cientistas que participam da avaliação da OMS está a pesquisadora baiana e membro do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia, a médica infectologista Glória Teixeira. Segundo ela, são grandes as expectativas para o resultado, porque a doença transmitida pelo mosquito Aedes aegypti não é um problema que afeta apenas os países subdesenvolvidos, mas é uma ameaça em todo o mundo, inclusive nos países ricos.
“Atualmente, além dessa vacina, estão em desenvolvimento outros imunizantes, como o desenvolvido pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em parceria com a farmacêutica GlaxoSmithKline (GSK), o Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos (NIH) e o Instituto Butantan, o problema é que essas substâncias ainda se encontram na fase 1 ou 2 dos testes”, esclarece Glória Teixeira.
Os encontros para avaliação do produto serão realizados em junho, em Lion(França) e em setembro, em Genebra (Suíça). De acordo com diretora de saúde pública da Sanofi, a médica Lucia Bricks, os estudos clínicos mostram que a vacina tetravalente contra a dengue é bem tolerada, com perfil de segurança semelhante após cada uma das doses. “Os resultados preliminares de eficácia demonstram, pela primeira vez, que uma vacina candidata contra a dengue é capaz de proteger contra a doença. Em 2014, estão previstos os resultados dos estudos de fase III, em mais de 31 mil indivíduos, que vão avaliar a eficácia da vacina em uma população mais ampla e em diferentes ambientes epidemiológicos”, comenta.
Em 2011, essa mesma comissão participou da avaliação de uma versão anterior apresentada pelo mesmo laboratório, no entanto, na época, o produto apresentado não mostrou efetividade na imunização contra o sorotipo DEN2. “Na época, a comunidade científica ficou bastante desanimada, pois era e ainda é o estudo mais avançado que dispúnhamos”, completa Glória Teixeira.
Pesquisas
A pesquisadora baiana diz que a notícia de uma nova versão da vacina contra a dengue chega em excelente momento, pois as últimas análises realizadas apontam que houve aumento da incidência e da gravidade da dengue na última década. A revisão publicada na edição mais recente do periódico científico PLOS Neglected Tropical Diseases traz dados epidemiológicos registrados em 51 estudos e revela tendências que merecem atenção.
A análise dos dados demonstra o aumento do registro de casos graves com o consequente crescimento das hospitalizações e mortes, sobretudo devido à circulação conjunta dos quatro sorotipos do vírus no país e à alta incidência da doença. De 2000 a 2010, mais de 8,44 milhões de pessoas contraíram dengue no Brasil – o maior volume em todo o continente americano no período – sendo 221 mil casos graves, com mais de 3 mil mortes. Em 2010, foram registradas 80 mil hospitalizações relacionadas à doença.
Outra tendência apontada pela revisão de literatura, apesar da intensificação das medidas de combate ao mosquito, é o constante aumento do número de casos notificados ano a ano. Somente em 2010, mais de um milhão de brasileiros foram infectados. Em 2000, o total de casos registrados não ultrapassou 200 mil.
Também foi observada uma distribuição da doença em todas as faixas etárias. Desde 2007, a dengue, antes mais comum em adultos jovens, também passou a acometer crianças e idosos.
Segundo Glória Teixeira, que é uma das autoras da pesquisa, o controle do vetor não dá certo. “Os estudos mostram que o mosquito está se adaptando à vida moderna e conseguindo vencer todas as barreiras de controle colocadas”, explica a cientista. Ela lembra que, entre as muitas adaptações, o mosquito não está agindo apenas nos trópicos, ele já atua 35° ao Norte da Linha do Equador e 35° ao Sul, ampliando a contaminação em países como os Estados Unidos.
Salvador está entre as cidades com maior número de casos
Este ano, até o último dia 12, foram notificados 2.504 casos de dengue na Bahia, correspondendo a uma redução de 91,89% em relação ao mesmo período de 2013, quando foram notificados 30.884 casos. De acordo com o levantamento da Secretaria Estadual de Saúde (Sesab), do total de municípios baianos, 199 (47,7%) notificaram a doença, com destaque para Salvador (729), Feira de Santana (296), Itabuna (192), Pintadas (131), Teixeira de Freitas (75), Jequié (66), Porto Seguro (52), Ituaçu (48), Mirante (44) e Barreiras (42), que concentram 66,9% dos casos do estado da Bahia.
A mais nova orientação do Ministério da Saúde para os casos de dengue ocorridos em 2014 prevê que esses deverão seguir a nova classificação de casos: dengue, dengue com sinais de alarme e dengue grave. Até o momento, foram confirmados 11 casos de dengue com sinais de alarme e 3 casos de dengue grave no estado, entre esses, um óbito no município de Coaraci.
Em Salvador, houve um aumento de 63% de notificações de casos de dengue. Desse total,613 casos foram identificados como suspeitos, 100 (16%) foram confirmados como dengue clássica. Entre os distritos sanitários com maior número de casos destacam-se Cabula/Beiru, Boca do Rio e Barra/Rio Vermelho.
Além da vacina, o Brasil também desenvolve a cultura de uma bactéria chamada Wulbachia que destrói o vírus, impedindo a disseminação da dengue. O estudo é feito pelo Instituto Oswaldo Cruz, Fundação Getulio Vargas, a Universidade Federal de Minas Gerais e FioCruz.
Fonte: Carmen Vasconcelos/Correio