Na madrugada do dia 14 para o dia 15 de abril, de 1912, o luxuoso transatlântico colidiu com um iceberg no Atlântico Norte por volta da meia-noite, afundando em menos de três horas.
Foram 1.517 pessoas mortas e 706 sobreviventes, dos 2.223 passageiros e tripulantes. O iceberg perfurou cinco dos 16 compartimentos estanques supostamente projetados para reter água em caso de ruptura do casco. Água é água e mais água, vento e mais vento frio, cerração e naufrágio. Pobre Titanic!
Um só daqueles iceberg e um só daqueles gemidos bastaram a lançar ao fundo do mar gelado tantas vidas preciosas. Há ainda quem espere algum destemido; outros descreem de tudo e não esperam nada. Talvez não seja o melhor. A esperança é longa, e pode fazer por muito o ofício de verdade. 706 sobreviventes que quando chegou o desespero no mar gelado e a demora a alma estava acostumada. Seja como for, os vivos acudiram aos sobreviventes, a piedade abriu a bolsa, por toda a parte houve um movimento, justo assimilar. A dor humana, e os nossos hóspedes, mostra-se também compassivo.
Por que ainda lembrar o dia 12 de abril de 1912? Porque homenagear os mil quinhentos e dezessete mortos, se quase 20 milhões em todo o mundo perderam a vida em acidentes rodoviários entre 1898 e 1998, e mais de 30 milhões na epidemia de gripe espanhola e outros 700 mil na pandemia da covid. A chuva cessará de todo. Já uma parte do céu se havia descoberto, deixando aparecer o rosto da lua cheia, cujos raios pálidos e frios brincavam nas pedras e nos telhados úmidos. Além disso, o passado é sempre fragmentário. Jamais o podemos reconstruir em suas minúcias, pois, como lembra Goethe, do que foi feito ou dito, uma ínfima parte foi escrita, do que foi escrito, uma ínfima parte foi conservada. É, assim, um erro ver o presente com os olhos do passado, como o inverno, examinar épocas antigas com preconceito modernos. Deve ele seguir o conselho de Anatole France e ser, por estranho desdobramento, homem antigo e homem moderno, e viver sobre dois planos diferentes.