Perdi um amigo hoje para este vírus e, ao abrir os jornais, leio: “1.214 mortes em vinte e quatro horas”. Imagino a morte a puxar tanta gente para o interior da ardente terra, tornando tudo cinza e pó. E ninguém consegue explicar porque nesta era tecnológica, onde existe inteligência artificial, um mísero vírus mate tanto de forma tão primitiva.
Sofremos neste mundo pandêmico, que está vinculado à condição humana num nível diferente do animal, já que um cachorro vadio pode estar neste momento rosnando para dois urubus pousados nos detritos e o sol batendo em cheio na areia com ou sem pandemia, e este cachorro não sente está grande dor do mundo, uma dor do que foi interrompido, está faculdade de todo ser humano de celebrar o viver em reuniões sociais.
Emergimos em um mundo onde o contato está mais frio e distante. Esta pandemia foi inesperado e rápida também, e lembro da frase do autor inglês Somerset Maugham no livro “Servidão Humana”: “Não adianta lamentar o vaso quebrado, se todas as forças do universo se reuniram para fazê-lo cair de nossa mão”, e lembro também a frase de Buda: “Em nossas vidas, a mudança é inevitável. A perda é inevitável. A felicidade reside na nossa adaptabilidade em sobreviver a tudo de ruim.”
Na cabeça de muitos, se olhamos dentro dela, estará cheia de pensamentos sobre sobreviver a este vírus, uso de máscara, álcool gel e distanciamento social, mas quando a vacina devolver às rotinas será preciso ter um pouco de imaginação fechando os olhos sobre este mundo exterior e perseguir um tempo sem ameaça, já que hoje cada perda trouxe uma sensação estranha de insegurança de nossa impotência perante sua implacabilidade e como a casualidade governa grande parte da existência humana.
Nunca se deve subestimar a maneira pela qual todos nós somos reféns dos ritmos aleatórios da vida. Estamos sempre tão no controle, tentando conquistar a vida que desejamos, que jamais permitimos reduzir a velocidade a ponto de sentir qualquer coisa como neste período que deveria ser de reflexão.
*João é natural de Salvador, onde reside. Engenheiro civil e de segurança do trabalho, é perito da Justiça do Trabalho e Federal. Neste espaço, nos apresenta o mundo sob sua ótica. Acompanhe no site www.osollo.com.br.