Pacotes prometem credibilidade: ‘Números fazem a diferença’, diz anúncio.
Psicanalista alerta para a baixa autoestima de quem contrata o serviço.
A popularidade na internet costuma ser medida por números. Os posts com mais curtidas aparecem em evidência na página inicial do Facebook. Ter muitos seguidores nas redes sociais é sinônimo de sucesso; e este comportamento na web tem gerado renda para os novos empreendedores em um negócio, no mínimo, inusitado. O grupo “Guia Publicidade” de Londrina, Paraná, por exemplo, oferece em seu site planos de pacotes que vendem seguidores para o Twitter e o Instagram, além de curtidas no Facebook e visitas em vídeos do Youtube.
Cinco mil curtidas no Facebook custam R$ 700. O grupo garante que o trabalho é executado em sete dias. Já 150 mil views no Youtube saem por R$ 800. Com o objetivo de promover o perfil de alguém ou de alguma empresa para milhares de usuários da rede, o negócio promete “dar uma nova dimensão na comunicação”. No site é possível ler os benefícios de contratar o serviço. “Maior credibilidade: transmita a melhor impressão para seus futuros visitantes. Números fazem a diferença”. Ou “Mais seguidores: com mais seguidores você estará atraindo cada vez mais seguidores orgânicos”.
Mas ter muitos seguidores ou curtidas não é suficiente para atender todas as demandas de determinados usuários de perfis nas redes sociais. O Namoro Fake permite contratar uma mulher ou um homem, ambos reais, para se passar por seu namorado ou namorada de mentira na rede social. O serviço, por tempo determinado, oferece alguém que tenha grau de afinidade com o comprador. O contratante tem que definir os posts e os comentários que o namorado (a) “falso” irá escrever no seu perfil.
Flavio Estevam, de Campo Grande, Mato Grosso, tem 32 anos e é o criador do Namoro Fake. Ele conta como surgiu a ideia de abrir o negócio: “Há cinco anos crio trabalhos na internet e, por isso, observo muito o comportamento nas redes sociais. Em janeiro deste ano, notei que um amigo estava querendo causar ciúmes na ex-namorada escrevendo comentários em seu próprio perfil do Facebook demonstrando que tinha ficado com outra pessoa. Decidi arrumar uma amiga para confirmar a história e se passar pela tal ficante. A ex-namorada do meu amigo ficou Luca, eles conversaram e eles voltaram o namoro. Perguntei se ele pagaria por este serviço e em cinco dias montei o site. Em uma semana já tinha 15 clientes”.
Em quatro meses, o empreendimento já tem 12 mil clientes. Segundo o idealizador, no início houve até fila de espera. Funciona assim: as pessoas, com perfis reais no Facebook, se candidatam no site e passam por uma avaliação da equipe do Namoro Fake. O candidato recebe 50% do valor pago pelo cliente. De acordo com Estevam, atualmente menos 5% dos que se oferecem por passar pelo falso namorado são aprovados. Já o cliente escolhe o plano (que muda de valor dependendo do tempo de duração) e para ele aparecem 12 perfis de pessoas diferentes. Ele não pode postar nada no perfil da falsa namorada. Os comentários são enviados para o sistema, que passam por uma moderação, e a namorada fake os posta.
“O principal critério é que o perfil seja real. E o segundo é que a pessoa não esteja “em um relacionamento” no Facebook. Também escolhemos pessoas, ao menos, apresentáveis. Não são feias, nem bonitas”.
Quando iniciou, o site era um produto apenas para os homens que buscavam namoradas para impressionar. Desde abril, as mulheres também se tornaram clientes. Flavio Estevam garante que, mesmo com estes três meses de diferença, os pedidos do sexo feminino já ultrapassam os do sexo masculino.
Na terra do Tio Sam
O empreendedor disse que devido ao recebimento de pedidos vindos dos Estados Unidos, ele lançou, há 20 dias, o www.namorofake.us . Até o fim do ano, Flavio Estevam pretende espalhar o Namoro Fake em seis países.
Mudança de perfil
O amigo de Flávio já contou para a namorada que tudo não passou de uma armação para tê-la de volta. Mas o que o idealizador do site acha curioso, é que a maior procura, atualmente, não é mais para causar ciúmes em alguém, mas sim, vinda de pessoas solteiras que desejam impressionar. “Há pessoas que contratam três ou quatro ‘ficantes’ para mostrar para os amigos. Mudou totalmente o perfil”.
Fidelidade Face
Na mesma linha do Namoro Fake, o mesmo empreendedor criou o “Fidelidade Fake”, que faz testes de fidelidade no Facebook. O contratante escolhe uma pessoa para dar em cima da namorada através do bate-papo. A pessoa contratada puxa conversa, passa cantadas e testa a namorada do cliente para saber se ela toparia um convite para sair. É feito um print screen da tela com a conversa, que é enviada ao cliente que contratou o serviço. Em três semanas, mil planos foram comprados.
Solidão e baixa autoestima
De acordo com a psicanalista Mônica Nicola, a solidão e a baixa autoestima faz com que as pessoas contratem este tipo de serviço. “É o chamado marketing. Se você tem muitos amigos, mais pessoas vão querer se tornar suas amigas. O sujeito passa a ter prestígio, fama, reconhecimento. É como em um Big Brother, onde do dia para noite um anônimo se torna super conhecido. Pode acontecer em casos diferentes. Por exemplo, uma atriz iniciante que queria ser conhecida e utiliza este recurso dos seguidores com esta finalidade. Ou uma pessoa que não tem absolutamente nada e devido ao fato de sentir sozinha, também contrata o serviço”, explica.
Ela chama a atenção também para o caso em que pessoas adicionam ou seguem personalidades e artistas nas redes sociais. “Quando eu sigo ou sou amiga do Ivan Lins, ou outro artista, me sinto importante, é como se eu conhecesse, como se ele fosse meu amigo”. A psicanalista também lembra que utilizar ferramentas como o Facebook ou Twitter pode fazer com que qualquer um se torne uma pessoa pública. “As pessoas estão amando estarem expostas. Elas estão se tornando pessoas públicas a partir do momento em narram o que está acontecendo e são seguidas”.
Alugue uma família S.A.
Em 2012, o diretor dinamarquês lançou o documentário “Alugue uma Família S.A. Filamdo no Japão, o filme conta a história de Ryuichi. O personagem leva uma vida aparentemente normal, exceto pela natureza de seu negócio. Usando apenas seu celular e seu laptop, ele comanda uma pequena empresa especializada em contratar pessoas para desempenhar diferentes papéis, ajudando seus clientes a encenarem vidas que, na verdade, não têm. Com uma boa sacada, o documentarista filma o dia a dia de Ryuichi, mostrando como sua relação com seus filhos e sua mulher é distante. Em um paradoxo, ele tem um emprego que “conserta” situações familiares, mas a sua própria família é um problema que não consegue resolver.
Fonte: Isabela Marinho/G1