Uma pesquisa baseada no uso inédito de uma tecnologia para testagem de Sífilis e HIV permitiu rastrear a prevalência dessas doenças na população indígena do Amazonas e Roraima. Antes, os pacientes precisavam ser removidos para as áreas urbanas. Agora, em 20 minutos, na própria aldeia é obtido o resultado – a mesma tecnologia será utilizada em gestantes em todo o país, por meio da Rede Cegonha (veja abaixo). Com o diagnóstico, foi possível o início imediato do tratamento para esses pacientes. A ação é uma parceria da secretarias Especial de Saúde Indígena (Sesai) e de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, da Fundação de Dermatologia Tropical e Venereologia Alfredo da Matta (FUAM), da Fundação Bill & Melinda Gates e da Organização Mundial de Saúde (OMS). Os resultados estão sendo apresentados durante o I Encontro de Participantes do Projeto de Teste Rápido nos dias 24 e 25 de maio, em Manaus.
De acordo com o secretário Especial de Saúde Indígena, Antônio Alves, o projeto buscou vencer as barreiras geográficas para diagnóstico destes agravos. É a primeira vez que o teste rápido para sífilis é utilizado no país. “O sucesso desse trabalho só foi possível graças à parceria com as entidades envolvidas e os profissionais de saúde, que não mediram esforços para colher as amostras e tabular os dados com qualidade. As comunidades escolhidas estão em áreas de difícil acesso, com algum interelacionamento dentro e fora da comunidade”, destacou. As áreas onde a sífilis apresentou maior prevalência foram na região do Alto Solimões e do Vale do Javari, localizadas na região da Tríplice Fronteira, situação de facilita o contato com não-indígenas.
Ainda de acordo com a pesquisa, fatores externos e internos foram apontados como causadores desta vulnerabilidade indígena. Entre os externos estão a ocupação ilegal de não indígenas, turismo e a presença de organizações não governamentais. Os fatores internos apontados pelos pesquisadores são o desconhecimento sobre DST/Aids, uso de álcool, presença de comunidades indígenas em centro urbanos, migrações, restrições de uso de preservativo e festividades com presença de não indígenas.
RESULTADOS
De acordo com o estudo, a prevalência de sífilis na população indígena avaliada foi 1,43% – um índice considerado elevado pelos pesquisadores. A prevalência de HIV foi de 0,1% na população testada, baixa quando comparada a população geral do país (0.6%). Em gestantes indígenas, o percentual de sífilis foi 1,03% um pouco mais baixa que as taxas encontradas em gestantes que moram nos grandes centros urbanos (1,6%); já a prevalência de HIV foi de 0,08%.
Até o momento, foram testados 45.612 indígenas, acima de 10 anos de idade, o que representa 54,7% da população indígena de Amazonas e Roraima. No total, serão testados pelo projeto, 83.311 indígenas destes dois estados, atingindo 100% da população dos dois estados correspondendo a 195 etnias espalhadas em áreas indígenas. A intenção da Sesai é ampliar a testagem para outras comunidades indígenas do país ainda este ano, devido ao contato dos índios com os não-índios. A primeira etapa do projeto termina em 30 julho.
O PROJETO
Em 2008, a Fundação Bill e Melinda Gates financiou sete projetos em vários países para expandir o diagnóstico e tratamento da sífilis em populações vulneráveis. No mesmo ano, foi selada uma parceria com o Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais/SVS/MS para detecção de HIV e sífilis. O projeto enfocou as populações indígenas nos estados do Amazonas e Roraima. As áreas foram escolhidas por estarem em localidades remotas ou de difícil acesso, e englobam nove Distritos Sanitários Especiais de Saúde Indígena (DSEIs): Alto Solimões (sede em Tabatinga), Alto Rio Negro (sede em São Gabriel da Cachoeira), Manaus, Parintins, Purus (sede em Lábrea), Médio Solimões (sede em Tefé), Vale do Javari (sede em Atalaia do Norte), Leste Roraima e Yanomami (ambos com sede em Boa Vista).
O Departamento de DST/Aids forneceu todos os testes rápidos de HIV utilizados no projeto. Coube a Sesai o treinamento dos 509 profissionais envolvidos, a realização dos testes nas comunidades, compilação e comunicação dos dados à FUAM, o fornecimento de penicilina para o tratamento da sífilis e os custos de transporte das equipes. A FUAM ficou responsável pelo fornecimento dos testes rápidos de sífilis (inéditos no país), a elaboração do projeto, a execução do controle de qualidade, a coordenação logística e o fornecimento de todos os outros insumos necessários para a realização da pesquisa. Além disso, houve um apoio Fundação Bill Gates que doou US$ 500 mil para a implementação do projeto.
REDE CEGONHA E TESTE SÍFILIS
A mesma tecnologia de testagem para sífilis será utilizada para gestantes em todo o país, por meio do Rede Cegonha. Em 2008, prevalência da sífilis foi de aproximadamente sete mil grávidas. Isso poderá evitar a transmissão da doença ao bebê (ou seja, a sífilis congênita, cuja taxa de incidência, em 2008, foi de 1,8 caso/mil nascidos vivos). A doença, quando não provoca a morte do bebê, pode causar problemas auditivos, visuais e neurológicos à criança. Toda a estratégia da Rede Cegonha prevê um investimento de R$ 9,4 bilhões até 2014. O objetivo é qualificar toda a rede de assistência obstétrica (às mulheres) – com foco na gravidez, no parto e pós-parto – como também infantil (às crianças) até o segundo ano de vida.
Fonte: Valéria Amaral / Agência Saúde