Além de pagar mais caro, o consumidor enfrenta uma verdadeira saga até conseguir encontrar o produto, que sumiu das prateleiras
A vida não está fácil para quem quer evitar o mosquito mais temido do momento: o Aedes aegypti, transmissor da dengue, chikungunya e do zika vírus. Além do risco de ser vítima de uma das doenças, ainda tem o impacto no bolso.
A relação do zika vírus com o surto de microcefalia, confirmada pelo Ministério da Saúde, fez com que a procura por repelentes aumentasse 40% nas farmácias baianas. Junto com o crescimento da demanda, o preço do produto também disparou, sobretudo, dos repelentes a base de icaridina, que prometem um tempo de proteção de até 10 horas. Ao longo do ano passado, o produto Exposis na versão de 100 ml – o mais recomendado pelos médicos para as grávidas – subiu de R$ 42 para R$ 74, aumento de 76,19%.
Os números são do Sindicato do Comércio Varejista de Produtos Farmacêuticos do Estado da Bahia (Sincofarba). O preço subiu também nos produtos à base de citronela que ficaram 18% mais caros, com variação de R$ 11 para R$ 13 e nos repelentes compostos por dietil-toluamida (DEET), que tiveram um reajuste de 16,9%, passando de R$ 11,80 para R$ 13,80.
“O preço pulou por conta do aumento da demanda, que foi tão grande a ponto de deixar os estoques das farmácias e dos distribuidores completamente vazios. Nem mesmo a indústria esperava que a procura fosse tanta”, explica o vice-presidente do Sincofarba, Luiz Trindade.
Guerra diária
A fisioterapeuta Clarissa Gonçalves sentiu na pele e no bolso o reajuste do preço do repelente, além da dificuldade de encontrar os produtos à base de icaridina ou citronela na prateleira das farmácias.
Grávida de seis meses e com uma das filhas alérgica ao mosquito, ela tem adotado outras estratégias para tentar economizar no que vem gastando com repelente. “O repelente está bem caro, mas a gente não pode deixar de comprar não só porque eu estou grávida, mas também porque minha filha tem alergia ao mosquito. O cuidado é redobrado”, conta.
Se no início do ano passado ela pagava por um frasco de 200 ml de repelente a base de citronela R$ 20, o preço que paga hoje pelo mesmo produto mais que dobrou. “Gasto por mês uma média de R$ 80 para comprar dois frascos. Isso quando consigo encontrar na farmácia. A gente chega a rodar em até quatro lugares para achar o repelente”.
Clarissa tem feito de tudo para se ver livre do mosquito, sem ter que gastar tanto. “Às quatro da tarde fecho a casa toda e só ando com a raquete antimosquito para baixo e para cima. Ventilador e ar-condicionado ficam sempre ligados. Até um mosquiteiro tive que comprar para colocar na cama, na tentativa de manter o mosquito bem longe”.
A servidora pública Jamile Oliveira também tem gastado além da conta para manter o Aedes aegypti distante. Com um filho recém-nascido que vai completar 2 meses, ficou pesado comprar o repelente específico para bebês que custa R$ 59. Por mês, a despesa chega a R$ 120. A alternativa, então, foi redobrar a vigilância em casa e diminuir o número de aplicações do repelente. “A orientação do médico é aplicar três vezes, mas aí eu teria que gastar três vezes mais. A gente acaba pagando caro por um problema que é de saúde pública”.
Por causa do preço do repelente, Jamile só aplica o produto no bebê uma vez por dia, em contrapartida aumentou a preocupação em combater o mosquito. “Fico bem atenta quanto à prevenção. Não deixo passar nada que possa vir a ser um foco para que o Aedes se desenvolva”.
Em falta
Além de pagar caro, para conseguir encontrar o produto a base de icaridina ou citronela na farmácia, só mesmo procurando bastante. A reportagem percorreu pelo menos dez farmácias do Centro da cidade e não conseguiu encontrar o repelente em nenhuma delas. A reportagem só encontrou produtos à base de dietil-toluamida, como os da linha Off (da Johnson) ou Repelex, fabricado pela Reckitt Benckiser.
“Meu estoque está todo zerado. Desde o final do ano, não se encontra repelente à base de citronela ou icaridina. O povo só leva o produto com dietil-toluamida, se não tiver jeito. A gente só não vendeu mais porque faltou. A indústria não conseguiu acompanhar a demanda”, assegura o vice-presidente do Sincofarba, Luiz Trindade.
Algumas farmácias estão limitando a quantidade de repelentes por pessoa, como afirma o balconista da Drogasil do Shopping Barra, Alex Oliveira. “Quando chega, vem muito pouco. Cada cliente tem direito a comprar só três unidades, mas mesmo assim quem chega depois acaba ficando sem”.
Há ainda quem faça até reserva de repelente. “Tem gente que quando chega aqui e encontra o produto leva até seis de uma vez só. Isso quando não liga e fica numa lista de espera aguardando a chegada do repelente a base de icaridina”, ressalta o vendedor da Farmácia Santana da Piedade, Marcos Santos.
A bióloga Thalita Guabieri está grávida de 5 meses e não viu outra solução a não ser estocar o produto. No momento, contabiliza três vidrinhos do repelente guardados no armário, além do que está utilizando. A força-tarefa para conseguir encontrar o produto envolveu toda a família. “Cada farmácia que alguém entra, passa o olho e vê se encontra. Meu sogro foi quem comprou mais dois vidrinhos”.
Produção
Segundo o diretor geral do laboratório Osler do Brasil, responsável pela fabricação do repelente Exposis, Paulo Guerra, o aumento do preço do produto é resultado do impacto da variação cambial, já que 80% da matéria-prima para a fabricação do repelente é importada. “A pressão da alta do dólar foi muito forte, o que obrigou a gente a repassar este aumento para o consumidor por mais que a empresa tentasse absorver isto”, justifica.
Quanto à falta do produto, Guerra garante que até o final do mês de janeiro a oferta do Exposis deve se equilibrar. Para isso, a indústria antecipou a compra de matéria-prima e importou vinte vezes mais icaridina do que havia adquirido no mesmo período do ano passado. “A explosão de demanda foi muito rápida. Tivemos que antecipar tudo que tínhamos programado lá para o mês de março”.
O laboratório aumentou sua produção em 2,2 mil por cento na comparação com o começo do ano de 2015. A participação da Bahia como mercado consumidor também cresceu. Salvador e Feira de Santana concentram o maior volume de vendas. “O aumento de vendas no estado foi 26 vezes maior em relação ao mesmo período do ano passado. Muito maior que o restante do país, onde crescemos 18 vezes mais”, contabiliza Guerra.
Priscila Natividade/Correio