Cada ano tem a sua identidade, impregnado das características do ciclo que se abre, uma nova chance com as luzes do amanhã a frente. Mas tenho a possibilidade de sentir meu pulso mais lento do que apressado. Caminhei hoje pela orla, sob a pálida luz da aurora, observando o sol se elevar, me perguntando para onde minha vida está indo? E os anos cada vez parecem passar mais depressa. Quão longo, quão inesgotavelmente longo era o verão, quando eu era menino. O mundo tal como saiu das mãos de Deus, e operava em mim o milagre da força e da beleza e o que eu via era belo. Dos tempos de criança, tenho uma lembrança associada ao cheiro da terra em Porto Seguro, onde morei dos quatro aos oito anos.
Estou sempre mudando, evoluindo. Aprendo e esqueço coisas. Passo por estados de espírito, pensamentos e processos inconscientes diferentes. As células do meu corpo morrem e se regeneram.
É bom que o tempo seja uma construção. É assim que eu ando de aniversário em aniversário como quando eu era criança e ia da sala de aula até o pátio do recreio. Hoje o tempo desintegra-se em mera sucessão de presentes pontuais. Ele se esvai. O tempo que se esvai não é “habitável”. As coisas têm a tarefa de estabilizar a minha vida. Sua objetividade é a mesmidade, ou seja, apresenta uma identidade estabilizante, derivada do fato de que são a mesma cadeira e a mesma mesa que aguardam, com familiaridade permanente, eu que modifico a cada dia. As coisas são refúgios que estabilizam minha vida que passa. Pela “mesmidade” dos aniversários, sua repetição, tornam a vida suportável.