Bruno Surfistinha: garoto de programa baiano cria blog e relata experiências

Tem muita gente que gosta do que ele faz e seu faturamento mensal já bateu em R$ 11 mil

“O animal caminha vagarosamente até sua presa. Ele sente o cheiro do sangue mais de perto e logo deixa de lado a cautela rendendo-se ao instinto primal. A fome.”

Gostou do parágrafo acima? Não? Para o autor, não faz diferença. Tem muita gente que gosta do que ele faz e seu faturamento mensal já bateu em R$ 11 mil. A renda, porém, não chega através de direitos autorais ou participação em venda de livros. O autor do parágrafo acima é, na verdade, o garoto de programa Gabriel Ferrari.

Há dez meses nesta atividade, o rapaz de 26 anos nascido e criado em Brotas mantém um blog onde publica textos pessoais de ficção, impressões do cotidiano e narrativas sobre as aventuras da profissão. Foi um leitor (ou seria cliente?) quem questionou: “Você quer ser uma Bruna Surfistinha de pênis, é?”. Gabriel diz que não. Aliás, jura que nunca leu o blog da ex-garota de programa cuja história foi parar no cinema.

Com o segundo grau completo e querendo cursar Publicidade, Gabriel anda enfiado numa camisa cocotinha, fala sem tirar do rosto os óculos escuros de grife e articula bem cada frase. “Admito que entrei nisso pensando só na grana”, dispara ele, que antes de lucrar com a própria carne, ganhava o pão como vendedor de shopping.

Programas
Há três meses, Gabriel anuncia seus serviços no maior site de acompanhantes de luxo de Salvador. Desde então, diz, não houve dia de sossego. No mais movimentado, atendeu quatro clientes – e rejeitou o quinto.

Seu nome de guerra é fruto de uma miscelânea entre recordações infantis e sonhos automotivos. “Eu precisava de um nome pra trabalhar e sempre gostei de Gabriel. Já o sobrenome tinha que ter impacto. Acho Ferrari legal, lembra o carro, né?”.

Dono de uma visão quase economicista sobre seu ofício, Gabriel diz que começou a analisar “as oportunidades de mercado”, ponderou “os possíveis ganhos” com o fluxo de entrada e saída (de grana) e queimou a mufa por um ano antes de abrir o negócio.

“Eu tenho ambições e este foi o caminho que escolhi”, disse na conversa com o CORREIO. No seu blog, usou um tom, digamos, mais corporativo: “Agradeço sempre pelos resultados alcançados. Hoje posso dar rumos melhores a minha vida”.

Segredo
A disciplina de Gabriel é mesmo a de um executivo. Afinal, é fácil morar com a mãe, esconder a fonte de renda e se policiar para jamais cair em contradição? As desculpas na manga vão desde falsos trabalhos em lojas ou sites até a justificativa extrema, ainda não utilizada. “Já pensei até em dizer que estou sendo bancado por uma coroa rica”, revela.

Atualmente, Ferrari se vê em apuros. Finalizando a autoescola e prestes a comprar o primeiro carro, não sabe o que dizer em casa nem tem comprovantes que lhe permitam financiar o veículo.

“Tô dando um jeito aí. Meio na máfia, mas fazer o que, se eu não tenho contracheque?”. E se a mãe descobrir sua atividade? “Tenho coragem de admitir e continuar fazendo. Só não conto porque não vejo necessidade”, diz.

Namoro O que esconde da mãe, Gabriel conta para a namorada. Sim, ele tem namorada. “Ela só evita ler o blog”. A jovem tem razão. Não deve ser nada agradável ler trocadilhos como “Na cama, faço a ‘balisa’ (sic) do mesmo jeitinho e estaciono na garagem com perfeição”, ou algo mais ousado: “Perguntei onde era o banheiro enquanto o velho se ajeitava. Pus a camisinha, me benzi disfarçadamente e fui”.

Este último trecho é de um post sobre um programa que Gabriel classifica como a situação mais desagradável em que já se viu. As outras postagens profissionais recaem sobre seu propagado potencial bélico, apartamentos de luxo que conheceu em atendimentos em domicílio e viagens como acompanhante, além de recorrentes epopeias entre um motel e outro.

Público
Gabriel conta que o perfil do seu público alvo é variado. São casais à procura de aventura, mulheres casadas em busca do prazer perdido na rotina do lar, solteiros que tudo podem e tudo querem e, principalmente, homens – casados ou não – que se apresentam à sociedade como a mais eminente representação da masculinidade.

“95% dos meus clientes são homens. Qualquer um que começa a fazer programa já sabe que é desse jeito”, confessa. Entretanto, na primeira chance ele tenta afastar qualquer questionamento sobre sua sexualidade. “Sou totalmente hetero e 100% ativo. Gosto mesmo é de mulher. Não tenho dúvidas quanto a isso”, garante.

Como diz gostar de mulher, Gabriel diz gostar de livros, o que lhe levou a criar o blog e o trouxe até essas páginas. O garoto elege o Código da Vinci como a melhor obra que já leu e aponta o paulista André Vianco como seu autor predileto. “Um deus”, define.

Ficção
Amante de ficções sobrenaturais e/ou apocalípticas, Gabriel ouve com atenção a pergunta: “Será que isto que você vive não é uma ficção?”. Soa um tanto enigmático na resposta: “Talvez. Quem sabe não seja uma ficção real!”.

Então, na sua ficção real, Gabriel Ferrari encerra a entrevista e parte para uma “exclusiva” com um cliente. Antes, enfatiza que é uma pessoa normal. “O que faço não é o que sou”. Ainda assim, caminha vagarosamente até a próxima presa. Não demora muito, se rende facilmente ao instinto animal.

‘Blog é pra família’
Na avaliação de Gabriel, seu blog (www.gabrielesuaferra ri.blogspot.com) é uma “leitura pra família”, isso levando em conta que um pai mais conservador ou uma tia carola não se importará em ler que “À noite todo mundo vai querer deixar o romantismo de lado e ter uma boa noite de sexo, suor e gozo. É ai que vão lembrar de mim”. Ele defende seu ponto de vista com o argumento de que não fala das relações sexuais, mas do entorno. Descreve apartamentos, elogia clientes e demonstra fascínio por lugares que visita a trabalho.“Todo mundo conhece o sexo, então não preciso falar disso”.

Gabriel conta que decidiu criar o blog para ter um diferencial em relação aos outros garotos do site no qual está anunciado. Diz ainda que a clientela, em geral, adora sua página e muitos já se reconheceram nas postagens. “Mas sou discreto, não entrego ninguém”, atesta. Para ele, o diário virtual é um espaço em que pode expor o que pensa e provar que garotos de programa podem ser inteligentes. “As pessoas percebem que não sou só um pedaço de carne e a procura até aumenta”, conta.

Um dos indicadores que usa para medir o próprio sucesso é o contador do blog, que marca mais de 6 mil visitas em três meses e aponta navegantes de todo canto. “Já recebi muita ligação de outros estados. Até do exterior!”. Tranquilo, Gabriel sonha com a fama. “Quem sabe não faço um livro ou minha história vira filme”, diz, aos risos.

Fonte: Victor Uchôa / Correio da Bahia

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