Meu pai por ser magistrado tinha que ler muito, então comecei a ler cedo, na época quando tinha doze anos estes livros eram chamados de “livros de adultos”. Os meus favoritos eram Tolstoi e Flaubert Tolstoi porque li sua biografia em dois volumes, Flaubert porque li Madame Bovary. Não posso ter entendido muita coisa a respeito deles e tampouco lembro como foi essa experiência, mas parto do pressuposto de que aquilo que me atraiu foram os diferentes mundos que se abriram.
A Rússia tsarista e a França imperial no meio do século XIX. Madame Bovary eu devo ter lido da mesma forma como li todos os outros romances franceses como Os três mosqueteiros, ou mesmo O vermelho e o negro, que ficava na mesma estante. Não importavam sobre o que eram as histórias, porque eu estava em busca de atmosferas, que para mim, nesses romances do século XIX, estavam ligados aos cenários: estradas poeirentas, moinhos, rios, árvores frondosas, pequenos vilarejos rurais. Madame Bovary me deu tudo isso, e ler esse romance aos doze anos foi como sair em uma manhã bonita e fresca de verão, na qual o mar estava plácido e reluzente, as árvores permaneciam imóveis e o céu azul, como se fosse infinito.
Quando reli o livro na pensão em Irecê, como funcionário do Banco do Brasil, foi como exemplo de um romance realista, vi uma nitidez no livro, um sentimento cristalino de espaço e materialidade do qual nenhum outro romance escrito antes ou depois chegou sequer perto. Hoje muitos se perguntam como cavar espaço para si mesmo no mundo? Respondo lendo, livros são lapidados como diamantes e você terá um tesouro fabuloso.