MP denunciou pai e mãe da jovem pelos crimes de homicídio culposo, entrega de arma de fogo a pessoa menor, fraude processual e corrupção de menores.
Os pais da menina que atirou e matou a adolescente Isabele Guimarães Ramos, de 14 anos, em julho deste ano em um condomínio de luxo, em Cuiabá, viraram réus na Justiça nesta terça-feira, 17 de novembro. Amiga da vítima, a menina tem 15 anos e responde a um processo que tramita em sigilo.
A juíza Maria Rosi de Meira Borba, da Oitava Vara Criminal de Cuiabá, recebeu denúncia contra os pais da menor investigada pela morte da adolescente.
Os acusados foram denunciados pela prática dos crimes de homicídio culposo (quando não há intenção de matar), posse ilegal de arma de fogo, entrega de arma de fogo a pessoa menor, fraude processual e corrupção de menores.
O advogado do casal, Artur Osti, disse que o procedimento corre em segredo de justiça e não poderá dar esclarecimentos.
A magistrada determinou a citação dos acusados, que terão o prazo de 10 dias para responderam à acusação.
Aniversário e morte
“Isso pra mim é muito triste, mais triste ainda porque a minha filha era uma garota cheia de vida, cheia de sonhos. Isso tem sido parte de um processo muito doloroso”, lamentou a mãe.
A morte de Isabele ocorreu no dia 12 de julho em um condomínio de luxo no bairro Jardim Itália.
O ex-advogado da família da adolescente que efetuou o disparo explicou, à época, que o pai da autora do tiro acidental estava na parte inferior e pediu para que a filha guardasse a arma no andar superior, onde estava Isabele.
A adolescente pegou o case – uma maleta onde estavam duas armas – e subiu obedecendo ao pai. Apesar de estar guardada, a arma estava carregada.
Segundo o advogado, uma das armas caiu no chão e a adolescente tentou pegar, mas se desequilibrou e o objeto acabou disparando. A menina negou que brincava com a arma ou que tentou mostrar o objeto para a amiga.
A mãe de Isabele, Patrícia, afirmou que estava em casa quando foi chamada pela mãe da menina. Segundo Patrícia, ao chegar no local do crime, encontrou a filha no banheiro e já sem vida.
A adolescente que atirou chegou a ser detida em uma unidade socioeducativa, mas foi liberada para por meio de um habeas corpus um dia depois da internação.
Praticante de tiro
As duas famílias, a da adolescente que disparou, e a do namorado dela, praticam tiro esportivo, de acordo com a investigação da polícia. A Federação de Tiro de Mato Grosso (FTMT) disse que a adolescente que matou a amiga é praticante de tiro esportivo há pelo menos três anos.
Segundo a federação, o pai e a menina participavam das aulas e de campeonatos há três anos. Os nomes deles constam nos grupos, chamados ‘squads’, que participavam das competições da FTMT. Outros membros da família também participavam desses grupos e praticam o esporte.
O advogado da família contestou a informação e afirmou que a adolescente praticava o esporte há apenas três meses.
Perícia
Laudo da Perícia Oficial e Identificação Técnica (Politec) apontou que a pessoa que matou Isabele estava com a arma apontada para o rosto da vítima, a uma distância que pode variar entre 20 e 30 cm, e a 1,44m de altura.
Conforme o documento da Politec, Isabele encontrava-se no banheiro da suíte que fica no andar superior da casa da amiga.
Ainda segundo a perícia, em dado momento o autor do disparo também entrou no banheiro, na parte esquerda, com a pistola apontada para a face da vítima, e efetuou disparo acionando o gatilho.
Outra perícia indicou que o tiro que matou a adolescente não foi disparado acidentalmente.
De acordo com o laudo da Politec, a arma de fogo utilizada não pode produzir tiro acidental.
Nas circunstâncias alegadas constantes do termo de declarações da adolescente, a arma de fogo, da forma como foi recebida pela perícia, somente se mostrou capaz de realizar disparo e produzir tiro estando carregada (cartucho de munição inserido na câmara de carregamento do cano), engatilhada, destravada e mediante o acionamento do gatilho.
Cena alterada
Para a polícia, o empresário pai da adolescente teve uma conduta que pode ter atrapalhado a investigação.
“Quando a equipe do Samu chegou na casa, havia apetrechos de armas em cima da mesa e ele pediu para que a mulher guardasse. Isso não poderia ter sido alterado”, disse o delegado Wagner Bassi, da Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), que conduziu a investigação.
A cápsula da bala que atingiu a adolescente na cabeça também foi movimentada depois do crime pelo filho dele, que é irmão gêmeo da adolescente que atirou, o que pode ter atrapalhado a investigação.
Quatro policiais, sendo um delegado, dois investigadores da Polícia Civil, e um policial militar que foram até a casa depois do crime são investigados por improbidade administrativa.
Reconstituição
A reconstituição da morte de Isabele foi feita nos dias 18 e 19 de agosto, na casa da menina que atirou. O processo durou sete horas, e a adolescente não participou. A defesa alegou que ela não está em condições psicológicas de participar.
Foram reproduzidos todos os movimentos realizados pelos envolvidos no caso para apontar a compatibilidade das versões apresentadas na investigação. A simulação foi feita com três disparos.
A reprodução também contou com um grupo de 41 profissionais entre investigadores, escrivães, delegados e peritos.