Os produtos da indústria de base florestal representaram, no ano passado, 18% das exportações do estado
Nem toda a economia baiana patina na crise que assola o país. Enquanto diversos setores lutam para suportar o mau momento, a indústria florestal baiana comemora uma elevação no faturamento anual de 6,5%, um volume da ordem de R$ 9,02 bilhões em 2014. Se o mercado nacional sofre com o cenário econômico, o mundo precisa do papel e da celulose que são produzidos aqui.
E os números do setor mostram que, cada vez mais, a Bahia precisa da chamada indústria verde. Se em 2014 o saldo da balança comercial do estado – encontrado pela diminuição do que é vendido lá fora pelo que é comprado do exterior – foi de US$ 28 milhões, agradeça-se à indústria de florestas plantadas, base para a cadeia de papel e celulose, que deixou um saldo positivo de R$ 1,64 bilhão.
Os produtos da indústria de base florestal representaram, no ano passado, 18% das exportações do estado, ocupando o primeiro lugar em importância, seguido pela indústria química e petroquímica – tradicionalmente líderes nas vendas da Bahia para o exterior. Entre postos diretos e indiretos, a cadeia emprega 320 mil pessoas.
A celulose e a celulose solúvel foram responsáveis por 90% do resultado do setor florestal, cuja madeira aquece, literalmente, setores como a mineração, siderurgia e até a produção de energia. Com o resultado de 2014, o PIB do setor florestal baiano alcançou 5,4% do PIB total da Bahia, de acordo com dados do anuário Bahia Florestal, que será lançado hoje, a partir das 16h, na Federação das Indústrias do Estado da Bahia.
Os tributos gerados pelo setor – nas esferas municipais, estadual e federal – alcançaram a cifra de R$ 1,25 bilhão, o que representou 5,3% da arrecadação total da Bahia.
E a verdade é que o resultado pode ser considerado acanhado, se comparado ao potencial que o estado tem. Com os maiores índices de produtividade do mundo no plantio de eucalipto, base da cadeia produtiva, a Bahia é apenas o quinto estado produtor do país, com 8,7% da área total do Brasil. As áreas plantadas com a cultura ocupam 1,2% do território do estado, espalhadas pelo Sul, Extremo Sul, Oeste e Litoral Norte.
Demanda mundial
O mundo precisa de muito papel, diz o diretor de Relações Institucionais da Suzano Papel e Celulose, Jorge Cajazeira, que é também presidente do Sindicato das Indústrias de Papel e Celulose da Bahia (Sindipacel). Ele explica que o mercado cresce proporcionalmente ao PIB mundial e ao nível educacional. “O papel é apenas uma das aplicações da celulose, que é usada também em embalagens, tecidos… As aplicações estão no nosso dia a dia”, diz.
Ele ri ao se lembrar que no passado houve quem imaginasse o fim do papel. “As perguntas que as pessoas faziam a respeito do fim do papel não fazem o menor sentido. Em geral, o consumo do papel cresce com o PIB ou com a educação”, afirma.
Exemplo do mercado que o setor tem pode ser percebido no caso da Suzano. De acordo com Cajazeira, metade do que é produzido pela empresa na fábrica instalada no município baiano de Mucuri, no Extremo Sul da Bahia, é direcionado ao mercado asiático. “Os chineses estão utilizando cada vez mais produtos como papéis higiênicos, papéis toalhas e outros tissues (usados em produtos de higiene pessoal)”, destaca.
Ainda para o presidente do Sindipacel, a existência de demanda por papel e celulose, tanto no Brasil quanto no exterior, ajuda a indústria de papel e celulose a suportar as mudanças de cenários. “O setor tem passado pela crise que está no país com razoável sucesso. Acontece que, quando cai o consumo no mercado interno, sustenta-se a produção com o mercado externo”, diz.
Novos investimentos
O secretário de Desenvolvimento Econômico da Bahia, Jorge Hereda, acredita que o bom momento vivenciado pela indústria de papel e celulose deve servir de estímulo para a realização de novos investimentos no setor em breve. Ele diz que o governo vai se esforçar para estimular a expansão de áreas plantadas.
“Temos uma celulose muito competitiva no mercado internacional em razão dos nossos baixos custos de produção e da alta produtividade do nosso eucalipto. Então, oportunidades e novos investimentos se atraem”, acredita.
Impacto social
Entre 1991, época da implantação das florestas plantadas na Bahia, e 2010, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) dos municípios com operações florestais cresceu 84%, enquanto a média dos não florestais foi de 63% no período.
Em Eunápolis, as florestas têm impacto positivo, aponta o secretário de Desenvolvimento do município, Roberto Martins. “Qualquer monocultura tem seus problemas, mas o eucalipto trouxe receitas para a cidade e pessoas com um nível cultural e níveis salariais elevados”, destaca.
Bahia tem números de destaque na certificação ambiental
Embora a desvalorização do real em relação ao dólar tenha contribuído para o bom desempenho do setor florestal, o segmento “fez o dever de casa” nos últimos anos, ao investir em tecnologia e inovação, destaca o diretor executivo da Associação Baiana das Empresas de Base Florestal (Abaf), Wilson Andrade.
Segundo ele, a produção florestal na Bahia se destaca não apenas pelo nível de produtividade “ímpar no mundo”, mas pelas condições ambientais e sociais. “Nosso sucesso vai muito além do dólar. Seguimos um princípio básico que pode fazer a economia do país crescer, se trabalhar direito. Este ‘dever de casa’ que nos deu algumas condições”, conta.
Do ponto de vista ambiental, Andrade destaca o recorde do estado em áreas certificadas. “A Bahia tem 87% das áreas, quando outros estados brasileiros estão em torno de 60%”, compara.
“Além disso, a atividade é recordista também no índice de preservação de matas nativas”, diz. Segundo ele, a indústria de base florestal baiana preserva 0,7 hectare de matas nativas para cada hectare plantado de eucalipto. “O Código Florestal nos obriga a preservar 20% da área. Faremos mais do que o dobro disso”, destaca.
A postura adotada pela atividade deverá render benefícios em um futuro próximo, acredita. “A preservação custa dinheiro, mas dá valor no longo prazo”.
O setor florestal no Brasil captura 1,7 bilhão de toneladas de carbono por ano. De acordo com as estimativas do setor, este volume é o suficiente para o país “neutralizar” toda a produção de carbono emitida pela indústria.
Andrade acredita que, para continuar crescendo, o setor florestal na Bahia precisa contar com o apoio do poder público. “Se eu não tenho portos, se não tenho logística interessante, uma legislação ambiental adequada, vou afastar investidores”, destaca.
Atualmente, a Bahia conta com aproximadamente 700 mil hectares de eucalipto plantados e tem a possibilidade de ampliar a área em mais 300 mil hectares nos próximos anos. “A demanda mundial está crescendo, temos potencial para atender”, acredita.
Estado reforça seu potencial produtivo no setor florestal
Em entrevista exclusiva, a presidente-executiva da Indústria Brasileira de Árvores (IBÁ), Elizabeth de Carvalhaes, comentou os desafios do setor florestal, que quer diversificar a oferta de produtos e vê no investimento em tecnologia uma das melhores estratégias para conquistar mais mercados no exterior.
Os números do setor florestal indicam crescimento. Como explicar esse movimento em um momento de crise econômica?
De fato, a celulose brasileira tem sido beneficiada pelo câmbio, ao contrário de outras commodities, o que ajudou muito. A crise econômica existe, mas a celulose funciona numa equação por demanda e oferta, que no mundo continua crescente.
Além do câmbio, o que pode explicar o desempenho positivo do setor?
O Brasil oferece a melhor madeira do mundo para a fabricação de papel, além disso, é o país que fornece celulose com mais rapidez, já que temos o menor ciclo de produção do mundo, de apenas 6 anos. Os altos investimentos em tecnologia genética e em nanotecnologia também contribuem para o potencial produtivo do país.
Quais as perspectivas para o papel em um mundo cada vez mais digital?
O Brasil está se preparando para ser fornecedor de matéria-prima de múltiplo uso. Então é isso que o Brasil quer, ser reconhecido como a melhor expertise no mundo na diversificação de produtos a partir de espécie plantada. A estratégia do país para alcançar isso tem sido investir continuamente em tecnologia e em novas fábricas.
A Bahia tem um índice de produtividade superior à média nacional. Como aproveitar bem este potencial?
A Bahia tem os melhores clones do mundo hoje. O estado, com certeza, é um dos mercados mais fortes para entrar na pesquisa e oferta de outros usos do eucalipto, além do que se faz hoje.
Quais são os maiores gargalos do setor hoje?
A infraestrutura é o que mais impacta na diminuição da competitividade do setor.
Donaldson Gomes/Correio