As vendas de carne no mercado varejista da Bahia tiveram uma queda de até 25% após a deflagração da operação Carne Fraca, há dez dias, segundo dados da Associação dos Distribuidores e Atacadistas do estado (ASDAB). O órgão ainda prevê aumento no desemprego no setor por conta do impacto negativo da ação no mercado.
A operação da Polícia Federal foi para apurar o envolvimento de fiscais do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa) em um esquema de liberação de licenças e fiscalização irregular de frigoríficos de outros estados. Os estabelecimentos são suspeitos de vender produtos adulterados e até carne estragada.
“Há uma oferta bem maior de produtos no mercado interno e, com isso, os preços tenderão a cair. O aumento será muito bom para o consumo, mas, para o produtor, será muito ruim. Então, já estima-se aí que o número de desempregados em curto prazo da cadeia fique em torno de 7% a 10% “, afirmou o presidente da ASDAB, Antônio Cabral.
Segundo o órgão, os supermercados mantêm produtos de marcas investigadas nas prateleiras, mas mesmo com promoções que chegam a 30% as vendas despencaram nos últimos dias.
Desde que as investigações vieram a público, ao menos 22 países e a União Europeia, compradores da carne brasileira, anunciaram algum tipo de restrição à importação, o que levou à queda no valor diário das exportações. A China, maior comprador da carne brasileira em 2016, suspendeu as importações, mas já retomou as compras, assim como Egito e Chile.
O Ministério da Agricultura também suspendeu a licença de exportação dos 21 frigoríficos investigados pela Polícia Federal na operação — nenhum deles fica na Bahia. Seis dos 21 foram interditados.
Mercado baiano
Atualmente, o parque industrial baiano registrado no Serviço de Inspeção Estadual (SIE) é composto por 238 indústrias, sendo 38 matadouros frigoríficos (bovinos, suínos, caprinos, ovinos e aves), 141 laticínios, 23 de produtos cárneos, 11 de pescado, 13 de ovos e 12 de mel.
Em Itapetinga, no sudoeste do estado, onde fica o maior rebanho bovino da Bahia, frigoríficos que exportam carne para países asiáticos estão preocupados com as restrições. Um deles, que está em atividade há quatro anos e gera mil empregos diretos, começou a exportar a carne para Hong Kong e para a África há quatro meses e espera que a polêmica que envolve a produção de carne seja superada para ampliar os negócios para o Líbano e outros países do Oriente Médio.
“Isso prejudica a cadeia como um todo, desde o produtor a todos os frigoríficos. E nós nos incluímos nesse meio, porque isso tudo cria essa imagem negativa por um problema que nós cremos ser pontual. Cria uma imagem negativa para todo o país”, diz José Marcos Costa, diretor do frigorífico, que produz, por mês, cerca de mil toneladas de carne.
Aves
A Associação Baiana de Avicultura (ABA) diz que, como o estado da Bahia destina apenas 2,5% das 20 mil toneladas de frango que produz ao mês ao mercado exterior (para países como Venezuela, China, Hong Kong e Japão), ainda não há um impacto na produção, já que o mercado interno continua sendo abastecido.
No entanto, o presidente do órgão, Dario Mascarenhas, prevê uma “inviabilização” da atividade no estado em função da concorrência, a médio prazo, que deve aumentar a oferta interna como consequências das restrições dos países compradores.
“O impacto maior [da operação Carne Fraca] é nas empresas exportadoras. Hoje, a Bahia entra com uma participação de apenas 2% da produção nacional e uma exportação muito pequena. Então, não está sendo afetada ainda. Mas a médio prazo, caso o mercado externo continue com as restrições, os exportadores brasileiros vão colocar os produtos que deveriam sair do país no mercado interno e esses produtos dos outros estados vão chegar aqui mais baratos e inviabilizar a nossa atividade. É uma coisa que prevemos caso a situação não seja normalizada até abril”, destacou.
Conforme Mascarenhas, a Bahia só produz 60% da carne de frango que consome. O restante vem de outros estados.
“Vai haver um desequilíbrio na balança entre a oferta e a procura. Esse excesso de produto no mercado, por conta da dificuldade em se exportar, vai fazer uma pressão muito grande sobre os preços e essa baixa nos preços com certeza vai afetar a viabilidade das indústrias baianas. Já estamos passando por uma crise econômica e isso já vem afetando e, inclusive, reduzindo a nossa produção e, se essa situação, não conseguir ser contornada, certamente o estado da Bahia terá uma perda muito grande na sua produção”, concluiu.
Fiscalização
A Secretaria de Agricultura do Estado (Seagri) tranquiliza os consumidores e diz que as carnes que vem de outros estados são fiscalizadas pelo Ministério da Agricultura e que os produtos dos frigoríficos interditados pela Operação Carne Fraca não chegam ao estado.
O órgão informou, ainda, que, mesmo não tendo sido apontadas quaisquer irregularidades em estabelecimentos voltados à comercialização de produtos de origem animal no Estado da Bahia, a Agência Estadual de Defesa Agropecuária da Bahia (ADAB), vinculada à Seagri, realiza o acompanhamento de todas as indústrias do estado, desde a etapa de avaliação do local de implantação, análise do projeto, aprovação final, até o registro com a liberação para o seu funcionamento.
“As plantas que sofreram interdição [em outros estados] não comercializam para a Bahia. Então, a população baiana pode ter essa segurança. São plantas que estavam localizadas em estados distintos, como no estado do Paraná, e esse produto não chega e não tem o trânsito para o estado da Bahia”, disse o secretário estadual da Agricultura, Vítor Bonfim.
A Adab destacou que o parque industrial da Bahia apresentou uma evolução significativa no número de plantas frigoríficas de abate de bovinos e outras espécies registradas SIE (Serviço de Inspeção Estadual): um crescimento de 93%, passando de 14 para 27 matadouros frigoríficos no período de 2007 a 2017.
Com relação ao abate de aves, neste mesmo período, segundo o órgão, também observou-se uma evolução: de 3 para 11 matadouros avícolas, um aumento de 267%. Em 2016 foram fiscalizadas aproximadamente 320.979 mil toneladas de produtos pelo Serviço de Inspeção do Estado, diz o órgão.
A Federação da Agricultura e Pecuária da Bahia (FAEB) também reforçou, por meio de nota, a confiança na qualidade da carne baiana e brasileira, que, segundo o órgão, atendem a requisitos rigorosos de segurança.