A VOZ DE VELUDO CALOU

A VOZ DE VELUDO CALOU
Texto escrito por Érico Cavalcanti

Eu conheci Ramiro Guedes em um programa de rádio chamado “Almoço à brasileira”. Naquele tempo, o programa era levado ao ar aos sábados, geralmente feito direto de um restaurante que a produção havia fechado o patrocínio para aquele sábado. Um amigo me levou e o formato do programa era entrevista com música brasileira.

Como na época eu escrevia no Jornal Alerta, Ramiro ao me ver sentado veio até a mesa e resolveu me entrevistar. Falei sobre política local e também sobre as críticas que vinha fazendo ao prefeito da época.

Bom, desde esse dia nasceu uma amizade que, mais tarde, virou coisa de irmãos, confidentes um do outro. Fui fazer a campanha do padre Aparecido, Ramiro do candidato do PT, arrumei então um adversário, o mais leal adversário, ele me ligava e dizia que ia bater no padre, eu dizia que não adiantava eu bater no candidato dele que ninguém conhecia, ia bater nele.

Fizemos assim, ele batendo no padre e eu batendo nele. Um dia eu coloquei uma coluna intitulada ‘A Voz de Veludo’. A história era de um locutor que havia trabalhado com vários políticos locais, tinha uma voz parecida com a dele, mas ele não conseguia mais achar um rumo, pois as ideias eram diferentes e um belo dia, desnorteado, resolveu parar, largou tudo e voltou pra música brasileira.

Ramiro me ligou depois de ler a coluna, achei que ele ia me desancar pelo telefone: “olha adorei sua coluna, principalmente do apelido“. Gostou tanto do apelido e da história que um dia alguém o chamou de ‘Voz de Veludo’ e ele disse: “Alto lá, o único que tem o direito de me chamar assim é o Érico Cavalcanti“.

Depois, um companheiro nosso inventou a Academia Teixeirense de Letras, Ramiro, que nessa época era diretor de Cultura do Município, resolveu que eu deveria participar da Academia, eu dizia a ele que ainda não tinha nenhum livro editado e ele, insistindo. Peguei minhas poesias, que não tinha mostrado ainda a ninguém, e levei pra ele : “Ramiro vê se você gosta”.

Deixei com ele e dias e dias depois ele me liga, marca um café comigo no Eduardo da padaria, que a essa altura está falando com Ramiro lá na outra dimensão. Sentamos e ele pega as minhas poesias e diz: “Aqui, está seu livro“. Ele tinha separado e arrumado como se fossem páginas: “Só falta você arrumar o título do livro “.

Eu fiquei surpreso, pois ele conhecia poesia como ninguém, resolvi fazer o livro. Disse a ele: “Vou fazer, mas você vai fazer o prefácio e escrever abaixo de cada poesia o que você acha”. Assim foi feito, o que Ramiro escreveu virou um livro dentro do meu.

Hoje ao receber a notícia de sua morte, deitado no meu leito de hospital, pego meu livro e leio chorando o que o velho urso branco escreveu. Quanta generosidade nos textos guedianos , como ele tratava os meus chamando-os de cavalcantianos . – Mal rompeu a manhã e a tristeza irrompeu em mim, Ramiro nos deixou ! A voz de veludo calou!

Texto escrito por Érico Cavalcanti.

1 COMENTÁRIO

  1. Muito bem escrito, aliás é característica de Érico Cavalcanti, a maneira suave e o toque pessoal de conseguir mesclar na dosagem certa, sem pieguice, a crônica com a emoção!

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