A nossa oração

“O fariseu, em pé, orava no íntimo: ‘Deus, eu te agradeço porque não sou como os outros homens: ladrões, corruptos, adúlteros; nem mesmo como este publicano. Jejuo duas vezes por semana e dou o dízimo de tudo quanto ganho’.” (Lucas 18.11-12)

O fariseu orou e refletimos sobre sua oração. Não me identifico com a oração dele, claro. Creio que você também não. Diria que temos juízo bastante para não nos gabarmos diante de Deus por nossa justiça própria. Mas, talvez devamos pensar um pouco melhor antes de seguir em frente como quem nada tem a ver com isso. A oração do fariseu pode ser considerada a expressão de seu modo de lidar com a vida e com as pessoas. Deixando um pouco de lado a questão do orgulho e da presunção, um outro tema torna-se presente: o tipo de fé, de espiritualidade do fariseu. Sua pretensa santidade o descomprometia com o outro, o distanciava e o fazia juiz. A espiritualidade cristã não nos permite algo assim. Não apenas porque nos iguala a todos sob o mesmo peso de sermos pecadores, mas também porque relaciona a vida na terra com a vida no céu, o relacionamento com as pessoas com o relacionamento com Deus. E isso é muito sério.

Seguir a Jesus é ser chamado a uma espiritualidade que transforma nossas palavras e atitudes em oração, adoração e devoção. Bem como nos chama a levar nossas orações, adoração e devoção para nossas atitudes e relacionamentos. Em outras palavras, não podemos ser uma pessoa diante de Deus e outra diante do nosso próximo. Simplesmente não há esta possiblidade, pois há um princípio em nossa fé que relaciona o que fazemos uns ao outros com o que fazemos a Deus. Foi o que Jesus ensinou e que todos nós somos lentos em aprender. Nossas ações e omissões diante de pessoas, nosso modo de lidar com as dores, injustiças e males do mundo, tornam-se páginas escritas no diário de nosso relacionamento com Deus. Nossas atitudes são orações que escondem aquelas que fazemos com nossas palavras. Foi o que Jesus disse: o que vocês fizeram a algum dos meus menores irmãos, a mim o fizeram (Mt 25.40). E o que vocês deixaram de fazer a alguns destes mais pequeninos, também a mim deixaram de fazê-lo (Mt 25.45).

Podemos discordar da oração do fariseu, mas diante dela devemos nos perguntar quais tem sido nossas atitudes em relação as pessoas e diante da vida. Que valores e bandeiras levantamos? São as que Cristo levantaria? Expressam amor a Deus e ao próximo? Creio que Deus não nos desprezará por causa do nosso egoísmo e mesmo cegueira espiritual diante da vida e das pessoas. Ele insistirá conosco e agirá para nosso quebrantamento. Ao nos abençoar, Ele deseja que sejamos bênçãos. E é na medida que somos que lhe damos louvores e inspiramos outros a crer no Evangelho. Evangelho que penetra mais profundamente em nossa alma na medida em que o deixamos conduzir nosso coração, mover nossas mãos, guiar nossa compreensão. Quanto mais amarmos, mais amor teremos para dar. Quanto mais acolhermos, perdoarmos, respeitarmos, compreendermos, mais frutos brotarão dos frutos ofertados. Podemos discordar da oração do fariseu, mas corremos o risco de fazer uma exatamente igual com nossas atitudes. Que não seja assim. Que nossa oração, que nossas palavras e nossas atitudes, revelem um outro coração. Um coração feito de novo. Feito novo pela graça de Cristo.

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